quarta-feira

O som do falar

Um dia, no convés de um barco, encontrava-se uma portuguesa a ler um livro, uma mexicana também a ler e um russo simplesmente a bronzear-se. O russo pareceu muito belo quando se virou e recostado no braço direito, olhou para a portuguesa e pediu-lhe para ela ler alto. A portuguesa achou o pedido estranho, pois ele não ia entender. Mas ele respondeu que queria só ouvir o som da fala portuguesa. Ela assentiu e começou a ler alto. A mexicana parou de ler e começou a escutar. A portuguesa gostou de se ouvir e de sentir que os outros a ouviam. Sentia-se a cantar, pois era à música da sua fala que os outros atendiam. Após várias páginas a portuguesa parou. Por nada. Podia ter continuado, estava a gostar, não estava cansada, mas ali parou e olhou para os ouvintes. O russo pediu à mexicana que lesse o livro dela. De novo a música começou, agora em espanhol. A portuguesa não tentou perceber e o russo, de novo, não entendia nada da língua. A mexicana parou por seu acordo. Houve um silêncio preenchido de sol e de mar a bater no casco do barco. Quando a portuguesa estava para adormecer ouviu o russo dizer: "o português é como o vento a passar entre as folhas de uma árvore e o espanhol como a água a passar entre as rochas num ribeiro." Esta cronista disse: "O russo é como pedras a rebolar por uma montanha abaixo."