domingo

Amizades inquebráveis

Tenho um amigo e uma amizade que parecem nao fazer mais qualquer sentido. Tornei-me amiga de uma pessoa que foi morta por aquele que agora se diz meu amigo. Decidiu progredir na vida, passar de maluco a responsável pai de família. A normalidade da vida seria termos divergido para mundos apartados e eu diria a alguém quando visse o seu nome, conheci este tipo. No entanto, encontramo-nos de vez em quando, num mundo demasiadamente pequeno e conversamos entre comboios e avioes e despedimo-nos num abraço apertado em que sempre me pergunto, sentiste alguma coisa? Pergunto-me que peça eu sou no seu mundo organizado. No meu mundo despenteado, ele é uma garrafa que atiro ao mar e que o mar atira de volta e assim outra vez até nao sei quando.

sexta-feira

Churrasco ao frio

O húngaro perguntou-me o que é ser europeu. É complicado, tanto como explicar o que é sentir-me portuguesa. E no entanto, sinto-me portuguesa e sinto-me europeia. A forma mais fácil é eu pensar que o meu mundo encolhia e eu ficava reduzida a Portugal. Fica-se zonzo com a falta de horizontes. Ser europeu é talvez o chamar Alemanha lar e casa, com a mesma desenvoltura com que se diz adeus e se faz casa no país ali ao lado. Ou mesmo que o nao façamos, que o podemos fazer. É falar com um francês de decisoes em comum, eles, nós, há algo que queremos construir juntos, ou nao. O húngaro diz que nao é a favor da UE e pergunta-me o que é democracia. A democracia, digo-lhe, é somente a ilusao do poder ao povo, mas uma ilusao necessária. Seria a mesma coisa pôr bolinhas com os nomes dos partidos ou políticos numa tombola. O que interessa é mudar as cabeças. Nao há democracia na UE, ninguém pergunta nada ao povo, diz ele. Eu digo-lhe que se alguém tivesse perguntado ao povo nao havia UE. Será isto um paradoxo?

quarta-feira

De volta a casa

Oi people.

Estive uns dias no sul de França para um casamento. Muito multinacional. Os amigos do meu amigo são tão benetton que eu fiquei a pensar estar num zoo e na minha jaula dizia homo lusitanus. Sou um golfinho amestrado e andei a atuar portuguesa. Se o turismo aumentar no habitat no próximo ano, fui eu.

em agosto

No meio de uma conversa com o meu irmão, enquanto ele se queixava do Agosto e do trabalho que é esse mês com os imigrantes e eu a queixar-me dos matreiros dos filandeses, que me enganaram em 365 Euros e uns trocos, e ele surpreendido com os escandinavos serem desonestos e eu a dizer que aqui pra cima é muita fama, mas pelo menos lá embaixo roubam-nos com um sorriso de lata, com aqueles gajos ali de cima é como se nos estivessem a arrancar um dente à socapa, o meu irmão perguntou-me porque é que o mar é salgado. Ficou muito surpreendido quando lhe respondi. Não queria acreditar que eu sabia e dito assim, na minha maneira tão profissional. Finalmente, ganhei-lhe algum respeito.

Agora como é que eu lido com finlandeses? Com alemães a receita é, desde que eu esteja para fazer fitas: levo um amigo alemão que faz o papel do homem equilibrado e quando eles começam com desculpas, entro eu, esbracejo, atiro-lhes com lógica, começo a passar-me no meio da loja, pergunto-lhes se pareço estúpida, rodo os olhos com o que eu espero parece desprezo, e eles cagam-se de medo ou de vergonha, ainda não entendi. É claro que tens de ter a razão do teu lado, senão o melhor é fazer de imigrante perdida com grandes olhos assustados e rezar. Mas como raio é que são os finlandeses? Estes parece que cairam no caldeirão de botox em pequenos.

segunda-feira

O aspirador humano

Agora que o estado da Geórgia e seus apêndices de acontecimento estão naquele banho-maria conspirativo e a única coisa que me custa, para além do Putin (desconfio que porque já não falo português e só penso em português, digo o nome do homem puta à francês, e não sou capaz de dobrar a língua e dizer-lhe o nome de outra forma) é o Saskalichivia ainda ser presidente do país, ainda que tenha demonstrado a sua estupidez com expoente elevado. Nem uma manifestação, o que corrobora a minha baixa opinião das massas.

Mas como ia principiar a dizer, agora tive tempo para me dar conta das olímpiadas (mais ou menos, os alemães comentavam as medalhas, mas eu ignorei-os dizendo que há coisas mais importantes no mundo). Os fatos dos ginastas, que costumam ser uma dor de olhos, continuam a ser uma dor de olhos, havendo um pouquinho de alívio, assim parecido ao champoo a entrar nos olhos, nos fatos dos chineses. Por falar em chineses, esses seres perfeitos que vão percebendo a beleza visual associado às olímpiadas, deviam expulsar os corredores alemães, que destroem a harmonia de alturas. Tudo ali num montinho perfeito, se ignorarmos as estacas pálidas. Tentei ver o Usain Jamaicano ganhar os 100 metros, mas distrai-me sempre com o cu espichado doutro corredor, coisa que aliás me acontece sempre nesta modalidade. Alguém estudou a prevalência de cus espichados nos corredores masculinos de velocidade? É impressionante. Os quenianos são magros demais e ainda não vi gajo nenhum realmente bom. Estas olímpiadas foram até agora uma estopada.

A única coisa realmente interessante foi saber que o Michael Phelps come 12 000 calorias por dia. É todo um mundo de questões que se abre. Como é que ele arranja tempo para comer? O treinador manda com os frangos assados para a piscina? Só come Haagen Dasz (o que influi dentro de mim muito ódio e inveja)? É um aspirador com forma humana e pés de peixe (viram-lhes os pés? ele deve ter decidido ser nadador, porque assim podia usar os únicos sapatos que lhe servem: as pranchas de surfe.)? Opá, agora que já não há combates à porta da europa, posso retornar às minhas más piadas. Aaaaaaaaaaaaaaaahhhh

quinta-feira

O último a rir



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domingo

O meu contributo

Eu trabalho num daqueles sítios com gente de todo o lado. Um dos cuidados que tenho é não ser muito simpática com os recém-chegados, porque, para além de ser contra os meus princípios, pode resultar no síndrome do cão a perseguir-me até casa. Mas, num dia com sol, lá descambei para a minha simpatia contagiosa (porra para os meus genes) e tenho uma siberiana a perseguir-me com o seu sorriso envergonhado. Se não fosse o facto dela ser russa e não americana, pelo que é provável que o seu sorriso não seja falso, não me sentiria tão mal com a rasteira que eu amanhã lhe vou passar.

sexta-feira

O que se come

Uma galeria de fotos no Time, de famílias á volta do mundo e o que elas costumam comer. Eu cá ia para o Egito e fugia da Polónia. A casa dos butaneses é a mais bonita, talvez nao confortável, mas extremamente artistica.



A família Ahmed do Cairo, Egito.

quarta-feira

O pau para toda a culpa

Será que as mulheres estão num sistema igualitário com os homens? Eu penso que não. As mulheres têm que fazer escolhas que os homens não têm e têm que ouvir coisas que eles não têm. Resolvem não ter família e têm de ouvir que são más mulheres; resolvem ter família e trabalhar e tentam ser super-mulheres, já que a real partilha de tarefas em casa é ainda fraca, não o conseguem e têm de ouvir que são más mães; resolvem, se puderem, ficar em casa e têm de ouvir que não trabalham. Os homens não são obrigados a estas escolhas e não têm de ouvir que são a causa de poucas e infelizes crianças. É como as histórias biblícas: a mulher tem sempre a culpa, seja porque é muito esperta, seja porque é muito estúpida. Ou seja, são gerações e gerações a queimar bruxas e chegamos a este século e ainda somos queimadas, não literalmente (pelo menos por estas bandas), mas na opinião pública. Se bem percebo, pelo menos quando se fala de casamento para os homossexuais, a família é muito querida. Se por família querem dizer uma mulher a tomar conta de um homem e crianças, consigo então perceber porque é que os homossexuais não podem constituir-se em famílias. Porque na verdade, uma família é uma mulher e quem ela tem de tomar conta.

segunda-feira

O futuro dos velhos e dos novos

Querida Sabine,

mandaste-me há uns tempos uma ligação que me não convenceu. Infelizmente o título foi mal escolhido. Cria expectativas que não cumpre. Diz que é sobre cenários e tendências para os próximos 20 anos, contudo quando se lê é sobre hoje. Aquilo são os pontos das preocupações e dos medos atuais refletidos e magnificados no amanhã.

Por exemplo, relativamente ao envelhecimento da sociedade europeia tem a dizer isto:

"Problemas: No Ocidente, pressão sobre as populações mais velhas consideradas como um fardo.
Custos de saúde aumentados."

Isto é muito pouco.

Primeiro: um dos pontos que não aparece na ligação que me mandaste e que me parece uma falta de palmatória, é que com a desagregação da família alargada, a sociedade está demograficamente estratificada. Os adolescentes andam com adolescentes, os vintões com os vintões, os trintões com os trintões, etc. e não há grande mistura geracional. Cada estrato acha-se o rei do seu domínio e cada estrato vive na ilusão que sabe tudo o que há para saber. Isto, para além de ridículo, é o motor de muito do que acontecerá no futuro.

Segundo: a discussão é de uma riqueza que colocá-la em dois pontinhos é confrangedor. Na Alemanha, o sistema de pensões é realmente um "welfare state"*. Além disso, a geriatria nao vem de uma ditadura que os manteve analfabetos, pelo que na Alemanha não se fala só na faceta dos coitadinhos dos velhos, mas da gerontocracia. Porque não sendo analfabetos, há a possibilidade que estas pessoas se unam para lutar pelos seus interesses. Neste caso, podem tomar a democracia. Portanto, a maioria depende de um sistema que é alimentado pela minoria. Este sistema é controlado pelo governo, que está na mão da maioria e aqui estamos noutra parte da discussão em que os coitadinhos são os novos, sugados pelos avós. Mas será que isto irá acontecer? Têm ou terão os velhos a noção de grupo? Isto é que é uma pergunta interessante para um cenário de futuro do envelhecimento. Atualmente, na Alemanha, os sindicatos de trabalhadores são populados pela gerontocracia, que têm mais tempo nas mãos e ideias que, pelos nossos olhos, os novos, estão ultrapassadas e são economicamente contraprodutivas.

Nos EUA, um estudo (de um tipo chamado J.W. Button, que vi num livro que referencio mais abaixo) mostrou que em zonas eleitorais com mais idosos (que, além disso, votam em maior número percentual, que os mais novos) há menor apoio a políticas sociais pró-educação. Mas este é um estudo. Outros mostram outros fatores com maior importância nos apoios do eleitorado ao financiamento educativo: o sexo do eleitor (as mulheres são mais pró-educação), o nível de educação (mais letrado, mais pronto a apoiar a educação), o estatuto social, a cor política.

Terceiro: os velhos de amanhã são os novos de hoje. Portanto, que tipo de velhos seremos nós? Um dos cenários que vejo expectáveis para o futuro é que trabalharemos até cairmos para o lado. Isto significa que seremos um peso a considerar no local de trabalho e poderemos contrabalançar o ageísmo atual. É um cenário.

Em novita, convivi muito mais com pessoas muito mais velhas que eu, do que com os meus pares (achava-os parvalhões), pelo que sou incapaz de ver os velhos como coitadinhos. Também sou incapaz de me ver a mim no futuro como uma coitadinha. Ficaria extremamente desapontada se como velha, não serei mais que um peso no sistema de saúde. O que me traz ao último ponto: num mundo em que morrer já não é um processo natural, a decisão de morrer deverá estar cada vez mais na mão do vivo. Contudo, a morte deverá continuar a ser fundamental no âmbito psicossocial, caso contrário, a sociedade que criaremos será um sítio muito frio. Definir as guias para isto vai ser muito difícil, mas uma das grandes discussões dos próximos 20 anos.

Há um livro, infelizmente em alemão, sobre o futuro do envelhecimento. É uma compilação de textos de estudiosos alemães. Como o meu alemão é um tadinho, tenho extremas dificuldades em absorver o que aquele livro diz, mas para quem quer saber sobre esta problemática e sabe alemão, é um livro que aconselho. Talvez daqui a uns tempos seja traduzido. É o "Die Zukunft des Alterns: Die Antwort der Wissenschaft" (O futuro do envelhecimento: a resposta da ciência), editado por Peter Gruss.

*Em Portugal, o sistema de pensões é um esforço insuficiente: poucos pensionistas podem viver com o dinheiro que recebem (no melhor dos casos, sobrevivem). Os que se salvam são os que têm outros meios de aumentar o rendimento e ainda têm apoio familiar. Além disso, penso que em Portugal há outra tolerância à pobreza. Afinal, eles sempre foram pobres e a vida foi uma luta. Portanto, tudo o que vem a mais é bem-vindo e não posto para lamentações (para lá da linha de base lamentativa de um português médio). Os alemães são mais assertivos no que lhes é devido. Os portugueses novos resumem o seu papel nos problemas sociais do seu futuro envelhecimento em dois míseros pontos.