sábado

Antecipação

Em dias especialmente cheios de burocracias várias, já começo a sentir que o fim da vida é este infinito procurar de moradas de repartições, de leitura de condições, de assinatura de contratos, o eterno sentir de me estar a casar por, pelo menos, 12 meses. Após tanta assinatura depois da cruzinha, tenho medo que quando entrar na rotina do dia-a-dia, me sinta em falta de uma cara que olho em antecipação do que poderá dali sair, uma megera ou megero, a simpatia, sorrisos falsos ou verdadeiros. Posta, então sem distrações, perante a minha vida em Zurique, tenho medo do que já conheço desta cidade, de a ir detestar como se detesta uma sogra.

quinta-feira

Os turcos da Suíça

Os turcos da Suíça são os alemães. Um dia destes hei-de ler mais um daqueles títulos "Há alemães a mais?" e rir-me como a cobra do Pinóquio até ficar sufocada em schadenfreude. Queixam-se uns de que os outros não se sabem comportar, mal-educados, com a mania que o mundo é deles. Queixam-se os outros de serem tratados com rudeza. Li no jornal, que se apanha grátis na estação, que vai começar um novo jornal para os alemães na diáspora (diáspora a uma hora de distância!!!): para os ajudar a integrar!! Eu vou morrer a rir-me neste país.

domingo

A estrela

O Roman Polanski foi talhado para a tragédia. Até a tragédia de estar entre dois mundos que teimam em ver o mundo da mesma forma, mas com óculos diferentes. Por ele ser artista supremo, puseram-no noutro nível de julgamento, de um lado como desculpabilizante, do outro como motivo de assédio. Se Roman não fosse Polanski, o caso ter-se-ia resolvido há 32 anos e não tendo sido resolvido teria sido esquecido por agora. Se Roman não fosse Polanski teria sido recambiado sem baixo-assinados e sem ministros. Mas quando se nasce com uma estrela, ela persegue até à morte. Se ele morrer atropelado por uma estrela cadente, não se surpreendam.

sábado

badalam levemente como quem acorda por mim

Há uns tempos, talvez já contados em ano, li que, num promontório qualquer da Suíça, queriam proibir por lei a construção de mesquitas. A razão mais proeminente dada, era o barulho. Depois disso, na India, estive perto de uma mesquita pela altura em que estão a rezar ou a chamar para a reza ou a cantar no duche, e aquilo é mesmo um chinfrim. Na altura pensei, nos neurónios que ainda não tinham migrado para um côncavo escuro do meu corpo, "os suíços é que têm razão". Agora estou na Suíça e é uma chinfrineira de sinos. Têm imensas igrejas, todas com badalos, a badalar a qualquer hora, desde a madrugada à noitada. Disseram-me que um, obviamente hereje, requisitou que só badalassem depois das 9h. Não, responderam, que isto já se fazia assim há centenas de anos.

Como estão a ver, os suíços são muito mauzinhos a inventar desculpas.

Adenda: Onde vivo agora, a igreja católica só toca para a missa: para ir e na saída.

sexta-feira

E andam-me a dar nóbeis a moleiras importadas da roménia

Meu Deus! Ele vai tornar-se alcoólico!, ouço gemer as duas velhinhas simpáticas que lêem este blogue e prefeririam que eu rezasse a algum santinho até que a irritação passasse e a dor se transformasse em prazer mórbido, como tantas vezes lhes acontece a elas quando tratam do buço. Mas não é em bebedeiras que eu estou a pensar, afinal sempre preciso de trabalhar daqui a pouco.

Parece que a vampira alemã escreve weltliteratur, que é traduzido em miúdos, todas aquelas histórias que emociona pseudo-intelectuais do mundo inteiro. Eu só gosto de cómicorealismo, que é traduzido em miúdos, pegar na vida e transformá-la num riso, se não no bom gosto de um sorriso. De resto, quero que vão todos para o caraças, incluindo o Roman Polanski, que vive numa cadeia perto de mim.

P.S.: Já agora, relativamente ao prémio nobel da paz, congratulo-me que o deêm a um gajo que não fez a guerra antes de tentar a paz. Este pelo menos não fez ainda nada, para lá de ser uma paixonite para adultos. Mas ó pra mim, eu tenho o potencial para ganhar um nóbel. Ó PRA MIM! Eu faço umas merdas na ciência! Alô ALÔ!

quinta-feira

Pide em Zurique

E perguntam: onde andas. E eu digo: cá estou, Zurique. Há gente a falar português debaixo de cada pedra: brasileiros, portugueses e angolanos já foram detectados pelo radar lusolândia, tantos que me saturam o detector. Por exemplo, no outro dia um grupo de turistas brasileiro em excursão relâmpago (aquelas em que tens 1 hora para ver Zurique, 2h para Munique e 4h para Paris) entupiu uma daquelas ruas estreitíssimas da zona antiga e ali fiquei num engarrafamento pedestre. Por exemplo, no outro dia estive a ouvir a conversa de um mocinho brasileiro a explicar a uma alemã que os portugueses falam muito depressa, mas é a mesma língua e que só gosta de espanhol por causa da música. Gostei tanto dele, que quase fui à mesa dele e me apresentei devagar. Mas talvez percebesse que eu tinha passado a última meia-hora a espiar e coibi-me. Por exemplo, no outro dia três angolanos divertiam-se com piadolas à custa dos locais e eu fiz um esforço desmesurado para perceber-lhes o português. Conclusão: tenho passado os últimos dias a viver a vida de um pide.