terça-feira

Comecando um poste sobre regras

Na sociedade portuguesa é suposto nao cumprir as regras. Nao é síndrome do portugues, mesmo que o portugues nao queira ser chico-esperto, o portugues tem de o ser porque as regras estao feitas para isso. Faz-me lembrar uma frase que ouvi em miúda, talvez nao tao miúda, que ficou-me gravada, que era "Portugal tem das melhores leis do mundo." É claro que quando se poe mundo numa frase já se está a errar. Quem pode saber do mundo? Mas imaginemos que é verdade. Melhor como? Nesse dia em que ouvi essa frase e a boca se fez num O (uau, temos as melhores leis do mundo), tirei a conclusao: "a culpa é do portugues, que tendo das melhores leis do mundo, nao as sabe usar". Vinte anos depois a conclusao que eu tiro é outra: "essas leis nao sao para pessoas, nem para a vida que as pessoas fazem, sao para um ideal de pessoas e para um ideal de situacoes que vivem na cabeca de quem faz as leis".

5 comentários:

jj.amarante disse...

Peço desculpa do comprimento desta transcrição dum texto do Rui Tavares
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No meu tempo de faculdade, a única maneira de ainda ter aulas com o professor José Mattoso era inscrevermo-nos numa cadeira opcional de História das Religiões na Idade Média. Eu fui um dos sortudos que assistiu a essas aulas — e uma em particular é o ponto de partida para esta crónica. Naquele dia o professor comentava um catecismo medieval irlandês e, de passagem, notou como muitas das suas interdições sobre alimentação e sexualidade eram praticamente impossíveis de cumprir, seja pelo seu grau de pormenor, seja pela profusão de dias sagrados (e respectivos interditos) que quase chegavam a ocupar um terço do ano. Tal não nos devia espantar, dizia o professor, pois o cristianismo medieval tem uma relação que se poderia chamar de “dialógica” com o Ideal da lei. O Ideal era para ser aclamado, consagrado, glorificado; não tanto para ser cumprido. Quanto mais próximo do ideal, melhor. Porém, todos nascemos em pecado e vivemos em pecado, tendo a doutrina margem suficiente para cobrir a lacuna entre esse Ideal que está escrito e as práticas de nós todos pecadores aqui em baixo. Aliás, se pensássemos bem, essa relação “dialógica” com a lei sobrevivera muito mais no catolicismo e muito menos no protestantismo, sendo especialmente visível em países como a Irlanda (de que tinhamos ali um vestígio antigo naquele catecismo) e Portugal, onde a relação com a lei era fluida e cheia de folgas.
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que pode ser visto na íntegra aqui: http://ruitavares.net/textos/da-vontade-de-nao-ser-levado-a-serio/

Não digo que tenha ficado conformado com esta relação dialógica mas fiquei muito mais descansado por me parecer ter finalmente compreendido a origem do que se passa com as leis e o seu cumprimento em Portugal.

Rita Maria disse...

Há também um lado normativo nas leis, elas tentam, pelo menos, fazer sociedade para além de regrá-la. A lei escreve que nao pode existir discriminaçao e nao acaba automaticamente com ela, mas vai-a tornando, aos poucos, socialmente errada.

Cabe à lei portanto definir um ideal (o direito constitucional à habitaçao por exemplo) e depois regular a possibilidade de atingir esse ideal e quais as penalidades em que incorrem os que dele se afastarem. A lei define portanto que nao pode nunca haver formas ilegais da obtençao de provas, como a espionagem ou a tortura e define as penalidades e as consequências de quando esse ideal nao se cumpre.

Isto é um ideal, uma investigaçao sem tortura ou espionagem nao permitida em tribunal. Mas quando depois o tribunal recusa essas provas, obriga os autores da investigaçao a aproximar-se do ideal. Isto, claro, em jeito de exemplo.

E depois, se as leis nao definissem o padrao ideal, definiam o quê? O que poderia ser uma lei do "menos mau"?

PS: Muito interessante a crónica do Rui Tavares!

abrunho disse...

Voces lancaram o meu caminho de raciocinio para fora da estrada, mas para campos muito interessantes. Isto é muito interessante, mas preciso de tempo para tecer uma prosa... Mais tarde.

Anónimo disse...

hum, pois! as leis não são a justiça e/ou vice-versa.e diria mais, as leis (assim no plural é q está correcto) não são aplicadas da mesma forma, mesmo q os juízes sejam "regidos" pelas mesmas leis...

Anónimo disse...

hum, e agora até fiquei um bocadinho "apavorada" mas há imensas leis q desconheço. como as poderei respeitar? pq quebrar as regras qd as conhecemos é uma coisa e quebrá-las qd não as conhecemos
e outra e como provar q não as conhecemos e quem nos defende e que grande confusão vai na minha cabeça...

é por estas e por outras q gosto de te vir ler.