quinta-feira

Muito lentamente escorre o ranho

Portanto, Helena, sair da Igreja católica não é a opção certa se desapontado. O que há é mudar o que está errado por dentro. Já pensaste que os guardas suíços não deixam entrar cavalos de tróia no vaticano? Imagina que o meu companheiro me dá uns estalos todas as noites? Fico para lhe mudar a atitude? Imagina que a tua filha anda com malta que fuma charros? Dizes para ficar e mostrar-lhes a maravilha da sobriedade? E quanto tempo esperas?

Eu pessoalmente não me dou com cadastrados. Chamem-me esnobenta.

6 comentários:

Helena Araújo disse...

Esnobenta.
;-)


E agora explica-me: sais da Igreja do padre Frederico, ou ficas na Igreja da Madre Teresa? Sais da da Inquisição, ou ficas na do São Francisco? Foges à Igreja do Papa, ou à do Tolentino e à do Frei Bento?

abrunho disse...

Isto agora é a minha experiência e o meu poste foi provocação quase sanguinolenta.

Eu não te quero dizer o que fazer, nem me mete impressão que as pessoas fiquem na igreja, mas não me venham dizer que esperam mudar a igreja por dentro. Os católicos são extremamente bons a aceitar os desvarios do vaticano como dislates do pai velhinho que é senil. Agora o pai senil andava a apalpar crianças, pelo que ficou mais difícil, mas é um interregno naquilo que sois bons: construir mundos paralelos e dizer "não é para ser levado literalmente". Ou, que há pluralidade de opiniões a gente escolhe do menu da cantina e não se interessa pelo restaurante. O que é tudo muito bem, melhor síndrome múltiplas personalidades que fundamentalista. Mas o que isto significa é que não ides mudar e nem quereis mudar a Igreja que é o Vaticano e as patas de polvo que vão por ali abaixo. Porque o que é duro e difícil não é para ser levado a sério. É uma grande chatice que a pedofilia não seja uma frase na Biblia.

Helena Araújo disse...

Vá, vá.
Se o teu tio andasse a apalpar crianças, se a mulher dele soubesse e não denunciasse, tu saías da família?
Uma coisa é um padre pedófilo e os superiores que não levantam ondas, outra coisa é o Vaticano, outra coisa é o conjunto da Igreja.
Não confundas o Vaticano com a pedofilia.

Fazer silêncio sobre os abusos sexuais de menores não é algo específico da Igreja Católica. Também aconteceu na Protestante, também aconteceu em instituições não confessionais e até estatais (Casa Pia), e acontece literalmente nas melhores famílias (o caso da brasileirinha violada pelo padrasto "nas barbas" da própria mãe é tudo menos raro). Parece que estamos a sair - finalmente, e felizmente! - de uma fase da nossa civilização em que a pedofilia era um mal ignorado por comodidade.

Penso que a tua crítica vem com umas semanitas de atraso. No entretanto, já os bispos reconheceram em público que o comportamento da Igreja perante a pedofilia tem sido uma vergonha, já o bispo alemão responsável por definir uma nova atitude da organização eclesial perante este crime foi recentemente ao Vaticano falar com o Papa sobre isso. E tenho a certeza que não gastaram tempo a bagatelizar o problema ou a arranjar desculpas.

Tanto quanto sei, neste momento o que possas criticar sobre o comportamento de algumas pessoas responsáveis dentro da Igreja já foi dito por elas. Que o silêncio que se fez em volta desses crimes é uma vergonha, que é preciso mudar a atitude, que nunca mais se pode encobrir um pedófilo, e até que é preciso observar cuidadosamente os candidatos a padre.
No que diz respeito à pedofilia, não preciso de ficar na Igreja para a mudar - ela própria já mudou.

Mas continuo a acreditar que a Igreja também é feita por mim.

abrunho disse...

Eu deixaria a minha família se a minha família estivesse conluíada com o meu tio.

Eu deixei a Igreja, antes de me ter tornado ateia/hereje, porque para mim a instituição tinha sido demasiadamente mentirosa com os seus princípios, para que eu quisesse algo com eles.

Não basta pedir desculpa. Principalmente quando já se tem currículo. Porque eu não vou tarde Helena. A Igreja está podre há muito tempo. E quando é apanhada e não pode fazer de conta que nada se passa, pede perdão.

Mas tu dizes, mas a Igreja não é só X e Y, é também Z e T. Eu não preciso de estar na Igreja para ouvir Z e T e respeitá-los, independentemente de estarem na Igreja. Estar na Igreja é uma imperfeição, mas posso ouvi-los na mesma.

Quando eu deixei a Igreja e ainda acreditava em Deus, foi uma decisão que era clara, se bem que difícil (eu participava, pelo que foi mesmo cortar com uma maneira de viver), porque como é que se pode chegar a Deus através de hipocrisia? Era-me óbvio que existiriam varias maneiras de chegar a Deus e que se eu escolhesse para a caminhada a companhia da Igreja, aceitaria tornar-me cumplice nos seus pecados.

Eu não cheguei tarde, Helena. Eu já pensei nisto há muito tempo e até sem pedofilias. A Igreja vai é preenchendo o curriculo e pelo caminho pedindo perdão. Eu repito, a Igreja, a Instituição, a hierarquia, muitos dirigentes da Igreja durante décadas protegeram pecados contra outros. Não foi só X e Y. Foi a estrutura. Escolher daí Z e T, é o eterno filtrar do que dá geito. É hábito.

Helena Araújo disse...

Eu só falei dos tios, não falei da família toda. Não foi *toda* a Igreja Católica que andou metida na pedofilia.
E se a tua mãe não estivesse conluiada? Deixavas a família?
Começavas a chatear a tua mãe, "ó mãe, parece impossível ainda estares nesta família apesar do que o tio e a tia fizeram!"?

Se queres sair, sai. Mas escusas de estar agora do lado de fora a exigir que os outros te sigam o exemplo.

Já agora, quando vais deitar fora o passaporte português? Não me parece que Portugal se tenha portado muito bem no processo da Casa Pia. E, já agora, para que país queres mudar? Diz, e descubro-lhe logo uns podrezitos para te convencer a não ir para aí.

Não estou a desculpar de modo algum o procedimento de alguns responsáveis da Igreja Católica perante o crime da pedofilia. Mas uma coisa é o que alguns fizeram, outra coisa é dizer que todo o sistema participou. Finalmente, o risco de um certo anacronismo: essas coisas aconteceram num tempo em que havia outra atitude perante a pedofilia e perante a criança.

abrunho disse...

Eu não exigi a ninguém que saia da Igreja. Tenho os meus juízos, mas não os imponho. Eu não suporto muito bem andarem a deitar poeira para o ar e acho que esta desculpabilizaçãozinha muito pequenina de que o Papa acabou de exalar um último exemplo há um par de dias, é um insulto para as vitimas. Eu posso bem com a minha indignação. Sinto tristeza por quem teve de viver a experiencia de ser tres vezes ultrajado: pelo abusador, pela Igreja a acobertar e pela Igreja a mandá-los rezar.

Eu sou da opinião que a Igreja falhou como instituição. É isso que demonstram os relatórios, de sistemáticas coberturas, de sistemáticas movidas no terreno, de documentos de 2001 do Ratzinger, o cujo das desculpas, a dar ordens de como lidar e acobertar todo este abuso de crianças. No sistema político, estariamos a pedir a demissão. Na igreja pedem desculpa e que se mantenha a fé e que rezem. É isto que mais me indigna, este varrer da realidade com a vassoura da pseudo-filosofia. Dói-te? Reza. É esta a diferença com um país. Não parece uma luta com bruxas e moinhos.

Quanto à minha família, não lavo roupa suja no meu blogue. Mas a ideia de que tenho um cordão umbilical de milhares de quilómetros tem piada.

Eu acho que os católicos têm limites muito laços. É a minha opiniao. Nao me mostraste nada que me demovesse dessa opiniao. Os outros tambem fazem, nao funciona e é um pouco vergonhosa. Voltamos ao "Senhor Juiz, sei que é crime, mas todos fazem." Tu nao o farias, nao funciona, porque já fiz. Eram outros tempos, o Polanski tentou essa em 1974. Depois há o egocentrismo, que é de que só há escandalos quando é a igreja. Nao, Helena, há escandalos para lá da igreja. Tu é que te exaltas especialmente quando é da igreja.