sexta-feira
Katrina: desastre anunciado
Li imenso sobre o Katrina e a subsequente inundação. Uma das ideias que li muito na blogosfera e que não vi adequadamente rebatida foi a de que ninguém poderia ter previsto este desastre. Diz-se que foi um desastre natural, uma daquelas fatalidades que a natureza nos prega, assim como o tsunami asiático no Natal. Furacões na costa sudeste dos EUA não são imprevistos. De 1900 a 2004, 31 grandes furacões atingiram esta zona, 4 só em 2004 (ver aqui). Depois há os pequenos furacões e as tempestades...
Após o desvio à última do furacão Ivan de Nova Orleães em 2004, Shirley Laska do Centro para a Avaliação de Desastres, Resposta e Tecnologia (Center for Hazards Assessment, Response and Technology) na Universidade de Nova Orleães especulou sobre o grau de destruição que se teria produzido caso o Ivan tivesse acertado na cidade. Ela escreveu "Sem dúvida, teria sido um dos maiores desastres, senão mesmo o maior, a atingir os Estados Unidos (...) O furacão tinha o potencial para tornar o impensável em realidade. Da próxima vez Nova Orleães poderá não ter tanta sorte." Li isto na New Scientist de 10.09.05. Também falavam de um exercício de computador realizado no ano passado para simular que meios seriam necessários para fazer face a uma inundação extensa após um furacão ter atingido a zona. Nesta simulação um furacão de nível 4 - a categoria do Katrina quando entrou na costa de Luisíana - atinge Nova Orleães provocando o galgamento dos diques, deixando entre 400 000 a 500 000 pessoas sem casa devido às inundações. As lições retiradas não parecem ter sido levadas a bom cabo pelos organizadores desta iniciativa: a FEMA (A Agência Federal dos EU para a Gestão de Emergências) e a secção da Luisíana do Departamento para a Segurança Interna (Office of Homeland Security).
Há um ano atrás escrevia-se isto na National Geographic.
Os políticos, os técnicos, os cientistas, a população sabiam o risco. Contudo, a decisão política foi para não prever, outras prioridades berraram mais alto. Como se escrevia no editorial da edição referida da New Scientist:
O mundo pode ser sempre tornado mais seguro. A parte mais difícil é decidir que nível de segurança é aceitável e a que custo. O que é certo é que a forma como este tipo de decisões é tomada necessita de reflexão. O tsunami asiático e o desastre em Nova Orleães mostram claramente que os processos políticos que definem a prevenção de desastres não estão a funcionar. Uma opção é medir o sucesso na prevenção de desastres. Quantas vezes é que o sistema de diques holandês protegeu o país de inundações? Quantas vidas foram salvas e a que custo monetário? Em Novembro de 2002, um terramoto de magnitude 7.9 atingiu o Alasca, perto da conduta de óleo trans-Alasca, mas porque a conduta foi construída para arcar com terramotos, não existiram derrames ou qualquer desastre ambiental. Que valor dar ao dimensionamento melhorado? Estes números podem ser calculados. A barreira do Tamisa foi elevada 80 vezes em 23 anos para prevenir o cavalamento de marés de inundarem Londres. O custo de uma inundação grave foi calculado em 30 milhares de milhões de libras esterlinas. Se o sucesso for medido pelo que não acontece durante um terramoto, erupção, inundação, fogo ou tempestade, então talvez os contribuintes e os políticos possam achar que o preço da prevenção vale a pena ser pago.
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