O pessoal andava todo a gozar com o novo ecumenismo descoberto em Israel. É um gozo, é, mas surpreende? É um desafio à normal escala hipócrita que os senhores representantes das religiões conseguem esticar melhor que ninguém. Mas já se está à espera. Eu, se me apanhasse novamente como católica, a acreditar na trindade e que Deus pode ser omnisciente, omnipotente e bom, tudo ao mesmo tempo, que Cristo morreu por nós e que existe o reino dos céus, dos infernos e um centro de remissão chamado purgatório, etc e etc., eu seria uma católica não praticante, no sentido de que a minha vida religiosa não poderia nunca estar ligada à estrutura terrena da igreja. Não dá. Dá-me repulsa física. Eu tolero-os. É a minha vertente liberal. Mas fico extremamente feliz que viva numa sociedade em que a religião organizada perde importância sobre as vidas das pessoas.
Nesta sociedade ocidental, mais que a hipocrisia, o que me deixa de coração apertado, mal-disposta relativamente à religião é a sua capacidade para tornar as pessoas as suas próprias inimigas. Que se possa sofrer assim. Que as pessoas se desprezem pelo que são. Auto-mutiladas. Este é um efeito da religião que me deixa muito transtornada.
P.S.: O uso da religião, como ideologia, para justificar o assassínio não me faz colocar o ónus da culpa na religião em si. A religião é um meio e não a propulsora dos actos. Mas talvez esteja a usar dois pesos. Tenho de pensar melhor nisto.
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Sabine,
respondo ao teu comentário aqui, pois eu já pretendia escrever uma adenda posterior no poste, como se pode adivinhar pelo meu "Tenho de pensar melhor nisto".
Eu não uso dois pesos e duas medidas porque o escolho conscientemente, mas a nossa cabeça tem armadilhas de conceptualização, que nos podem pregar partidas. É preciso estar atento.
Eu sinto que a religião é um daqueles reinos que me podem pregar partidas. Primeiro porque nunca sei até que ponto eu poderei estar a ser demasiadamente tolerante por ter comido dela com o cerélac, por outro lado porque a tolerância é essencial. Há um equilíbrio que eu tenho de encontrar.
A religião (vou falar da cristã, que é a que conheço) contém o bom e o mau. Hoje em dia a sociedade secular leva a que as pessoas sejam moderadas e escolham a porção boa. Contudo, a parte má continua contida na Bíblia. Como se pode observar nos EUA, onde existem grupos cristãos mais fundamentalistas, nós, os que não partilhamos das suas visões podemos pela ditadura democrática da maioria engolir restrições à nossa liberdade individual, acções que não afectam outros adversamente a não ser nas suas ideias de moral e bons costumes. Quanto da proibição do casamento dos homossexuais, em Portugal, não é uma imposição de ideologias de cariz religioso?
Portanto, como a religião contém o bom e o mau, pergunto-me se não estarei a ser demasiadamente leniente com o cristianismo, escolhendo eu própria ignorar as potencialidades maléficas. Daí a minha conversa do dois pesos e duas medidas. Até que ponto posso absolver a ideologia, pôr o ónus somente no assassino que usa a religião como justificação, se as palavras de ódio continuam lá, no livro, ainda que todos nos digam que não é para levar literalmente. Pois, eu não levo, tu não levas, mas alguém pode levar, se não hoje, amanhã...
1 comentário:
«O uso da religião, como ideologia, para justificar o assassínio não me faz colocar o ónus da culpa na religião em si. A religião é um meio e não a propulsora dos actos. Mas talvez esteja a usar dois pesos. Tenho de pensar melhor nisto». Nao acredito que tenhas dois pesos e duas medidas!
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