domingo

Somos muito maiores do que qualquer categoria

Nos Estados Unidos estima-se que milhões de mulheres estejam ou já tenham estado casadas com homens que experimentaram relações sexuais com outros homens. Em Portugal não há números. Mas sabe-se que "muitos casam sabendo da sua homossexualidade". Por medo. Ou apenas "porque sim". Nem sempre acaba em divórcio. Mas repetem-se os momentos de dor e confronto. "Sair do armário não é fácil". Sobretudo quando se está casado.

Pelos Renas e Veados dei-me conta de um artigo no Público sobre os casamentos fachada, em que homens homossexuais casam (em Portugal será escusado escrever com quem). O artigo irritou-me porque a jornalista [Andreia Sanches] mostra perceber a sexualidade a preto e branco (as pessoas ou são homossexuais ou heterossexuais e quem tem relações sexuais homossexuais é directamente homossexual) e não realça o efeito da própria sociedade e as suas exigências na procura destes homens em fazer uma vida "aceitável".

A parte do artigo que fez eco em mim foi o baseado numa entrevista ao sociólogo Pedro Vasconcelos:

"Somos muito maiores do que qualquer categoria"

Sociólogo Pedro Vasconcelos defende que nem aos terapeutas
nem ao Estado compete dizer o que devem ser as famílias

Pedro Vasconcelos, sociólogo que se tem dedicado ao estudo das questões da família e sexualidade, lembra: "Antes da modernidade europeia não se construíam identidades baseadas na sexualidade."
(...)
A partir do momento em que "esquemas religiosos de controlo foram substituídos por esquemas médicos" dá-se uma alteração "gigantesca". O indivíduo que tem sexo com outros indivíduos do mesmo sexo já não é o que "cede ao pecado" - "e, em última análise, no catolicismo a tentação do pecado é permanente e todos nós podemos ser contagiados" -, é um indivíduo que se encaixa numa categoria, diz.
"É um paradoxo: somos muito maiores do que qualquer categoria (homossexual, heterossexual, bissexual, assexual...). Todas são demasiado simples face ao que é o abismo interior de cada pessoa, dos seus desejos, fantasias, sentimentos, mas também vivemos na relação com essa categoria e com as suas pressões normativas", que são difíceis de romper.
Num casamento no Registo Civil, por exemplo, "o conservador não se limita a dizer "assine aqui" - faz um discurso moral, fala dos deveres, da fidelidade, do carácter heterossexual do casamento". Na opinião de Pedro Vasconcelos, "não compete ao Estado apresentar um modelo de vida". Tal como não compete a um terapeuta dizer "o que as famílias devem ser". "Por que é que o casamento tem de implicar a recusa de ter relações sexuais com outros?", exemplifica.
Por tudo isto, a sua opinião "pessoal e política" é de que "o instituto legal do casamento devia ser abolido" - "o que o Estado tem de fazer é reconhecer às pessoas, na maneira como elas querem viver a sua vida, os seu direitos enquanto pessoas". A.S.[Andreia Sanches]


Categorizar dá muito jeito e pode até ser essencial para perceber (coitada da estatística se não houvesse categorias), mas há áreas em que não se pode andar sempre a simplificar. Penso que a identidade sexual é uma delas.

3 comentários:

Anónimo disse...

Olá... Nao sei bem como tive o prazer de encontrar e tua pag e gostei mt deste post. Axo o tema interessante e concordo k é bastante mau e infelizmente vulgar categorizar, rotular as pessoas. Estou no último ano do curso de psicologia e considero importante k cada um viva de acordo com akilo k se sente bem, o casal deve ser como ambos o desejam e não como a sociedade axa bem.
Desculpa esta intrusão...
Bjos

abrunho disse...

"Vive e deixa viver." Parece um lema tão simples, mas a maior parte das pessoas parece determinada em ser obstáculo. Talvez seja porque não têm vida. Têm tempo para se intrometer na dos outros.

Intrude à vontade. Se eu me chateasse com isso não tinha os comentários abertos.

Bjs.

João Melo Alvim disse...

A obsessão da preocupação com os gostos dos outros é uma das pedras-de-toque do tuga.

Concordo contigo em relação à simplificação, tanto que, como uma vez ouvi a alguém: "se tiver que me apaixonar, não será pelo sexo, mas sim por uma pessoa". Visão mais complexa, mas ainda assim mais compreensível, é impossível encontrar. Desde que uma pessoa seja feliz, quero lá saber do que fazem do que gostam. A aprovação social é um resquício ditatorial e uma semente totalitária. E a alegada preocupação social, muitas vezes, disfarça apenas uma curiosidade mórbida.