segunda-feira

Nao existir

Eu já tinha escrito este poste há uns tempos, mas estava indecisa em postá-lo. Resolvi faze-lo porque vi um poste em que se informa que os do "Nao" já andam com o absurdo slogan "E se tivesses sido abortado?". Por motivos pessoais esta é uma pergunta a que fui exposta. E se pensam que esta foi uma violencia desnecessária, informo que saí incólume, e se vos aflige quem me tentou usar os sentimentos, sintam a mesma repulsa pelos que usam esta táctica nesta campanha.

Entao cá vai:

Arremetida em lutas familiares que nao vou esmiuçar, desvelaram-me que quando eu estava em processo de construçao in uterus, o meu pai queria que a minha mae abortasse. Por esta altura, eu conhecia o meu pai intimamente. Nunca duvidei do seu amor por mim e pareceu-me descabido que algo que tinha acontecido antes de nos termos conhecido pudesse de alguma forma violentar a nossa relaçao. Comuniquei a irrelevancia do que me tinha sido dito e saí deixando os adultos nas suas infantis guerras.

Nunca a sensaçao de irrelevancia me abandonou, nao só no que o meu pai significa para mim, como se uma esposa fizesse uma cena porque o marido nao a amou antes de a conhecer, como a irrelevancia para a minha vida. Se eu nao tivesse nascido, nao tinha existido e nada. Há pessoas que diriam que eu teria sido assassinada. Para mim seria a nao existencia. Para mim nao existir e morrer nao é a mesma coisa. Relativamente ao que eu era nessa altura em que o meu pai duvidava, a discussao parece-me tao descabida como discutir o sexo dos anjos.

Eu votaria "sim" se pudesse, os meus pais disseram-me que votam "sim". Para mim, tem mais relevancia pensar nos que existem, nos que sentem, nos que tem consciencia, com tudo o que isso implica. Muitas vezes eu sinto, num amargor de coraçao, que se pensa mais no que nao existe, poderia existir ou no abstracto, do que nas pessoas de carne e osso. Eu sou pela pequena janela de oportunidade que este referendo dá, para a livre escolha da pessoa que está viva ao meu lado. Da mesma forma consciente e relevante que eu e o meu pai nos amamos porque ambos existimos. O resto é para o caso de eu querer escrever um livro de ficçao.

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