quinta-feira

Geração sem guia

O tempo anda depressa. Com trinta anos, a minha idade de crescer pouco teve a ver com a da minha sobrinha seis anos mais nova e é de um país extra-terrestre comparada com a minha sobrinha dezassete anos mais nova. Sento-me no sofá ao lado da geração mais nova e peço-lhes que me expliquem o que estão a ver na televisão. É aborrecido. Não resisto. Pego numa revista. Que chata tia, estás sempre a ler!

As minhas sobrinhas, do que me é possível ver, são saudáveis, têm pais que lhes deram/dão apoio. Não será como as meninas deste artigo* que me deixou numa tristeza funda. A situação descrita é nos EUA, mas será só lá? Resumido: meninas no inicio da adolescência fazem sexo oral a colegas, vários numa mesma sessão. Parece que é uma moda. A cronista compara a sua idade de crescer com esta idade de agora e ainda que ela tenha uns 20 anos mais que eu, ela está mais perto do meu crescer. É habitual as pessoas ficarem surpreendidas com o saber das crianças. Sabem tudo. Nós não eramos assim, pois não? Só que o que aquele artigo me diz é o perigo de saberem demais de algo e de menos de outro. Sabem tudo sobre sexo, mas não sabem como o incorporar nas suas vidas. Sabem tudo sobre a mecânica e nada sobre o emocional. O segundo é normal, são crianças, adolescentes, estão a crescer. Contudo, com tanta informação, eles precisam dos pais presentes que lhes traduzam o que ainda não dá para compreenderem completamente. Antes, a sociedade era proibitiva, fechada, claustrofóbica. Contudo, tinha o positivo de serem os adolescentes a procurar e isto, de alguma forma, protegia-os de saber demasiadamente cedo. Agora com a informação a ser despejada literalmente sobre as pessoas, de tal forma que só fechando os olhos é que não se vê, se os pais não estão presentes para dar uma moldura à pintura, parece que pode acontecer o que é descrito no artigo. Crianças perdem a noção da realidade em programas aberrantes, como a MTV descrita aqui, que eu de vez em quando espreito como se estivesse a ver figuras circenses do século XIX, a mulher barbuda dos dias de hoje; crianças descompreendem as canções que têm letras destas:

Ain't my job
To fuck you on your birthday
Ain't my job
To fuck you on your birthday anymore


Mas isto é suave...

“You make a nigga wanna fuck your ass on the couch / While we’re still in the club, show your pussy love / Work that clit / Cum girl.”

Estas músicas são ouvidas por adolescentes. Eu sou adulta. Eu sei rir-me com as idiotices da MTV, a mim desgosta-me estas letras, eu não preciso de ser cool, as mulheres magrelas das revistas de moda não me afectam, não sou pressionada pelos meus pares, eu, afinal, tenho mais caminho percorrido. Eu sou eu, daquela forma que se alcança quando se é adulto.

Mas os adolescentes andam à procura deles mesmos e andam-se a perder e a aleijar-se. Talvez me engane. Talvez não seja assim. Talvez seja só na América. Se calhar estou fora. Mas se calhar até não e a única solução são os pais. Que chata tia, não percebes nada disto! Talvez não, mas faz-me triste.

* via Voz do Deserto

6 comentários:

Helena Araújo disse...

Já tinha ouvido algo semelhante a propósito de festas de adolescentes no Rio de Janeiro, mas pensei que seria urban legend para sôfregos de pornografia.

Ontem contaram-me que um miúdo de 6 anos, depois da aula de educação sexual na escola, resolveu fazer uma aula prática com a irmã de 3 anos. A mãe encontrou-os nus, ele em cima dela, agitação incluída. "Estamos a fazer um filho", disseram eles, "e se sair com deficiência mental, não faz mal, vai para a escola onde a avó trabalha."

Não há dúvida: aprendem todos os pormenores técnicos demasiado cedo.

E depois, a adolescência: miúdas de 14 anos que perguntam a miúdas de 13 anos "queres ficar eternamente virgem?!"

Às vezes penso que o mundo dos meus filhos é muito mais duro que o meu foi.

João Melo Alvim disse...

A pressão social continua todinha lá, tomou é conta de outras áreas. Mas a razão parece-me ser mesmo a tal falta de moldura para os conhecimentos que se vao adquirindo mais cedo.

abrunho disse...

Pois não sei o que é pior, mas que eu não me conformo a esta idade MTV, isso não. Eu lembro-me de ver um programa na MTV em que filmavam uma rapariga que ia aumentar os peitos. Ela era menor de idade e a mãe cooperava. Eu fiquei chocada com aquela mãe. O objectivo da rapariga era conseguir uma sessão com a playboy. Ficou horrível, com uns peitos obviamente enormes para o corpo franzino. E eu só pensava: mas que mãe é esta!?!?!

abrunho disse...

Claro que os EUA conseguem sempre dar-nos extremos:

http://www.truthdig.com/eartotheground/item/20060503_purity_balls/

sabine disse...

Boa reflexao (e tambem gostei muito do link da "Controversa maresia", que nao conhecia). Tambem sinto o mesmo.

João Melo Alvim disse...

O problema daqueles tipos é mesmo esse: os extremos.

E voltaste a colocar a questão onde ela também deve estar: nos paizinhos e mãezinhas que, as mais das vezes, se demitem das suas responsabilidades e/ou transferem as suas frustrações sociais para cima dos filhinhos. Quanto a esta última, sempre foi assim, mas o exibicionismo social actual aumentou a fasquia.