Fotografia da Alta de Lisboa encontrada no
Viver bem na Alta de Lisboa
Eu escrevi esta entrada na segunda-feira, mas ao reabri-la para actualizá-la, apaguei-a. Este programa não é do mais amigável e agora com a minha nova versão do mozilla, em vez de melhorar, piorou.
Recapitulando: no Domingo li no Público uma notícia relativamente à Alta de Lisboa, segundo a qual os níveis de criminalidade são preocupantes. Estilo Farowest..
Eu conheci este projecto através da blogosfera [vivendo no estrangeiro este tornou-se um dos meus meios para me manter em contacto com o espírito do país]. Achei o conceito interessantíssimo e de vez em quando espreitava os vários blogues de futuros e actuais habitantes desta urbanização modelo. Gostava da alegria e do optimismo das pessoas ao encontrar um lugar onde acreditavam teriam qualidade de vida. Para mim a atitude significava que os portugueses estão mesmo a ultrapassar a fase em que só importa ter casa, umas paredes com um tecto a finalizar e se for preciso é um mausuléu desconfortável. Não critico, pois sinto que é o resultado de pobreza. Para estas pessoas a casa mais que um local para viver é um símbolo e nunca tendo experimentado conforto caseiro, também não sentem falta. Adicionalmente existe uma cultura de urbanização que espero ansiosamente que se acabe, mas que só acaba se as pessoas começarem a ter outras exigências.
Bem, este último parágrafo não existia na 1a versão, mas começa-se e já não se segue o mesmo trilho.
Outro aspecto foi a minha atracção pelo projecto de realojamento de pessoas que viviam em casas ilegais e/ou degradadas lado a lado com o pessoal que tem dinheiro para as comprar. Perspectivava para mim um passo na reintegração e no convívio entre pessoas que se estranham. O que é mau para uma cidade que se deveria querer solidária. Eu, que sou de meio pequeno, assusta-me o que me contam de Lisboa, a de hoje e a de antes, a que foi ignorada e produziu a situação que se vive hoje em Lisboa e, neste caso, na Alta. Pergunto-me da competência com que foi feito o realojamento. Os critérios da selecção. Parece-me óbvio que deveriam ter o cuidado de diluir as ovelhas negras entre as brancas [nenhuma conotação epidérmica, mas somente de atitudes sociais]. Já ouvi contar de realojamentos sociais e o descuido completo que existe, juntando a ovelha com o lobo. É quase ingenuidade irresponsável. Entristece-me que este projecto seja um fracasso por desleixo ou ignorância ou...
O que me surpreende é o silêncio na blogosfera. Pensava que a maior parte dos blogueiros são de Lisboa, mas ninguém pareceu prestar atenção à notícia. Perto das autárquicas e não se discute as propostas dos candidatos. Além disso, mesmo quando se fala do que se quer para Lisboa as iniciativas ao nível social raramente surgem. É o trânsito, os parques de estacionamento, as obras no Marquês... É como se os lisboetas fossem autopessoas. O carro é a extensão que lhes importa. Não é que não seja importante, mas não será pouco? Um artigo que me deixou inquieta a mim, que nem sou de Lisboa, e pareceu só incomodar quem vive na Alta. Parece-me tão louco.
quarta-feira
terça-feira
Estudar a Inteligência
Na blogosfera chegou-me à atenção este artigo. Foi através do Terras do Nunca e como é habitual quando um gajo vem com estas coisas eu praticamente sinto-lhe os tomates a tilintar. Este tipo de estudos têm a sua piada na esfera da brincadeira, mas no mundo sério é contra-produtivo. Andam as mulheres numa trabalheira dos diabos a conquistar o espaço que elas merecem na sociedade e por um sentimento ridículo de ameaça os homens poêm-se com tontices... [Ai, senhores que somos uns meros dadores de esperma -> The findings come from a study of 24,000 British students, and will intensify a battle of the sexes that was triggered last week by a BBC newscaster, Michael Buerk, who complained that life was now being lived according to women's rules. Buerk said men had been reduced to little more than sperm donors because of the female dominance of society. ].
Ficou-me na ideia a boca que o Terras do Nunca manda a uma das Glória Fácil, de que ela não gosta de ciência. Tive então curiosidade em dar uma olhadela à página pessoal do Dr. Richard Lynn (um dos investigadores). Queria ver isso da ciência. Mordia-me os calcanhares. Descobri que para lá deste senhor passar o tempo a tentar provar que existem diferenças sexuais na inteligência, também tem interesse no estudo de diferenças de inteligência baseadas em raça (segundo ele asiáticos>caucasianos>negróides) e o estudo de eugenia (senti calafrios, mas isso deve ser preconceito meu). Havia uma ligação a um estudo designado "Intelligence and the Wealth and Poverty of Nations". Não li tudo, mas antes de despegar sorri mordazmente quando ele escreve que é bem conhecido que existem diferenças nacionais na inteligência, mas só se cita a ele próprio! Além disso, existindo correlação entre inteligência e riqueza, a correlação não poderá ser inversa ao que ele tenta demonstrar? São tantos os factores que afectam a riqueza das nações, onde está o esforço em filtrá-los? Se me apetecer correlaciono o nr. de dias com geada num ano e a riqueza das nações e chego a um resultado positivo (já vi esta e deu certo)! Também me questiono se a inteligência é meramente uma capacidade de seguir padrões desenhados num pedaço de papel? Não será a inteligência multidimensional? O pessoal com inteligência tem a resposta a esta última.
Que eu me lembre, tive bons resultados no teste que o Lynn usou, mas pronto, sempre me chamaram Maria Rapaz. :-) E estou como o Alex de Viena (abaixo nos comentários), mas isso deve ser de ser mulher. :-)
Segundo este senhor uma colega minha é um ser absolutamente extraordinário. É uma boa investigadora, mas além de ser mulher é preta! A próxima vez que a encontrar presto-lhe uma vénia à japonesa.
Gostei dos comentários ao artigo do jornal. Deixo alguns. Há lá mais.
I do not believe, on average, that men are more intelligent than women. I'm convinced we often find more men at the extremes like in academia or indeed in the work place simply because we still live in a male-driven society. Women think differently from men, that I do agree with, but more intelligent? From my 'empirical analysis' I find this unlikely.
Jason Robinson, Cambridge
To throw in another possible factor, remember also the competitive aspect of IQ tests: the average man is possibly more likely to treat a measurement of his mental capacity as a chance to prove himself; the average woman may not push herself as hard as she does not consider the result quite so important.
Anne, London, UK
I scored relatively high in an IQ test when I was a child. Since then I have done many many many very very very stupid things in my life. I still wonder what that test has to do with intelligence or understanding at all.
Alex, Wien, Austria
If your report is accurate, what this study actually shows is that men are better at IQ tests than women. This is not (necessarily) the same as saying men are cleverer than women. That would require rather more criteria than just an IQ test.
Phil Evans, Keele, UK
Ficou-me na ideia a boca que o Terras do Nunca manda a uma das Glória Fácil, de que ela não gosta de ciência. Tive então curiosidade em dar uma olhadela à página pessoal do Dr. Richard Lynn (um dos investigadores). Queria ver isso da ciência. Mordia-me os calcanhares. Descobri que para lá deste senhor passar o tempo a tentar provar que existem diferenças sexuais na inteligência, também tem interesse no estudo de diferenças de inteligência baseadas em raça (segundo ele asiáticos>caucasianos>negróides) e o estudo de eugenia (senti calafrios, mas isso deve ser preconceito meu). Havia uma ligação a um estudo designado "Intelligence and the Wealth and Poverty of Nations". Não li tudo, mas antes de despegar sorri mordazmente quando ele escreve que é bem conhecido que existem diferenças nacionais na inteligência, mas só se cita a ele próprio! Além disso, existindo correlação entre inteligência e riqueza, a correlação não poderá ser inversa ao que ele tenta demonstrar? São tantos os factores que afectam a riqueza das nações, onde está o esforço em filtrá-los? Se me apetecer correlaciono o nr. de dias com geada num ano e a riqueza das nações e chego a um resultado positivo (já vi esta e deu certo)! Também me questiono se a inteligência é meramente uma capacidade de seguir padrões desenhados num pedaço de papel? Não será a inteligência multidimensional? O pessoal com inteligência tem a resposta a esta última.
Que eu me lembre, tive bons resultados no teste que o Lynn usou, mas pronto, sempre me chamaram Maria Rapaz. :-) E estou como o Alex de Viena (abaixo nos comentários), mas isso deve ser de ser mulher. :-)
Segundo este senhor uma colega minha é um ser absolutamente extraordinário. É uma boa investigadora, mas além de ser mulher é preta! A próxima vez que a encontrar presto-lhe uma vénia à japonesa.
Gostei dos comentários ao artigo do jornal. Deixo alguns. Há lá mais.
I do not believe, on average, that men are more intelligent than women. I'm convinced we often find more men at the extremes like in academia or indeed in the work place simply because we still live in a male-driven society. Women think differently from men, that I do agree with, but more intelligent? From my 'empirical analysis' I find this unlikely.
Jason Robinson, Cambridge
To throw in another possible factor, remember also the competitive aspect of IQ tests: the average man is possibly more likely to treat a measurement of his mental capacity as a chance to prove himself; the average woman may not push herself as hard as she does not consider the result quite so important.
Anne, London, UK
I scored relatively high in an IQ test when I was a child. Since then I have done many many many very very very stupid things in my life. I still wonder what that test has to do with intelligence or understanding at all.
Alex, Wien, Austria
If your report is accurate, what this study actually shows is that men are better at IQ tests than women. This is not (necessarily) the same as saying men are cleverer than women. That would require rather more criteria than just an IQ test.
Phil Evans, Keele, UK
Tou contigo
E a noite cresce por dentro
dos homens do meu país.
Peço notícias ao vento
e o vento nada me diz.
Mas há sempre uma candeia
dentro da própria desgraça
há sempre alguém que semeia
canções no vento que passa.
Mesmo na noite mais triste
em tempo de servidão
há sempre alguém que resiste
há sempre alguém que diz não.
Manuel Alegre
dos homens do meu país.
Peço notícias ao vento
e o vento nada me diz.
Mas há sempre uma candeia
dentro da própria desgraça
há sempre alguém que semeia
canções no vento que passa.
Mesmo na noite mais triste
em tempo de servidão
há sempre alguém que resiste
há sempre alguém que diz não.
Manuel Alegre
segunda-feira
Estar-se fora
Hoje senti-me mesmo emigrante.
Na página dos frescos passa-me pela vista as palavras do barómetro.
- "medo"? Mas estão com medo de quê? Pesquiso melhor... Ah! Os fogos...
- "silva"? Mas quem é o Silva? Aaah, poooois... É a parelha do Soares.
Na página dos frescos passa-me pela vista as palavras do barómetro.
- "medo"? Mas estão com medo de quê? Pesquiso melhor... Ah! Os fogos...
- "silva"? Mas quem é o Silva? Aaah, poooois... É a parelha do Soares.
sábado
É triste o previsível
Enquanto a retirada unilateral de Gaza entretinha o mundo, no exacto dia em que terminava o ultimato aos colonos, Israel anexava mais um pedaço da Cisjordânia.
Os vizinhos de Yussuf [palestiniano da Cisjordânia] têm na mão as notificações. Terra confiscada para fazer seguir o Muro à volta do maior colonato de todos, Ma"ale Adumim, planeado como uma bolha gigante dentro de território palestiniano.
Não haverá uma segunda retirada unilateral. Sim, vou construir na Cisjordânia. E Ma"ale Adumim deverá ser ligado a Jerusalém. Palavra de Sharon, domingo passado.
No Público de hoje
No Haaretz o editorial disserta sobre esta provocação em mau momento.
Enquanto o Primeiro-ministro palestiniano adverte que a expansão dos colonatos renovará a violência.
E na retaguarda O Hamas decidirá em breve se vai conter-se ou retaliar contra Israel, a propósito da morte de palestinianos, disse ao Yediot Aharonot uma fonte do exército. "O Hamas não faz diferenças entre Gaza e a Cisjordânia. Pedimos-lhe que mantivesse a paz durante a retirada [de Gaza] e eles cumpriram. Mas entretanto foram mortos quatro palestinianos em Shilo [por um colono de extrema-direita] e mais cinco em Tulkarm [pelo exército]", explicou o oficial. "O grupo está atento à "rua palestiniana" e averiguará em que sentido sopra o vento."
No Público
Os vizinhos de Yussuf [palestiniano da Cisjordânia] têm na mão as notificações. Terra confiscada para fazer seguir o Muro à volta do maior colonato de todos, Ma"ale Adumim, planeado como uma bolha gigante dentro de território palestiniano.
Não haverá uma segunda retirada unilateral. Sim, vou construir na Cisjordânia. E Ma"ale Adumim deverá ser ligado a Jerusalém. Palavra de Sharon, domingo passado.
No Público de hoje
No Haaretz o editorial disserta sobre esta provocação em mau momento.
Enquanto o Primeiro-ministro palestiniano adverte que a expansão dos colonatos renovará a violência.
E na retaguarda O Hamas decidirá em breve se vai conter-se ou retaliar contra Israel, a propósito da morte de palestinianos, disse ao Yediot Aharonot uma fonte do exército. "O Hamas não faz diferenças entre Gaza e a Cisjordânia. Pedimos-lhe que mantivesse a paz durante a retirada [de Gaza] e eles cumpriram. Mas entretanto foram mortos quatro palestinianos em Shilo [por um colono de extrema-direita] e mais cinco em Tulkarm [pelo exército]", explicou o oficial. "O grupo está atento à "rua palestiniana" e averiguará em que sentido sopra o vento."
No Público
Eles || Eles
A retirada concretizou-se. Espero o que vem a seguir sem expectativas. Virá mera política e provavelmente desilusão.
Os conflitos humanos não costumam ser a preto e branco, mas este é tão matizado, que receberia o prémio para o nó górdio do século. Quando era [mais?] nova e carregada de idealismos e simplicidades e inconsequências e toda emoção eu era completamente pela causa dos palestinianos. Eles tinham sido invadidos. Parava pouco em pragmatismos e na minha perspectiva os israelitas deviam fazer as malas e ir.
Agora sou um pouco mais ponderada. Mas tal não significa que não me confranja a situação trágica dos palestinianos, usados pelos que eles chamam irmãos, ultrapassados pela História, esmagados por um absurdo.
Israel foi um erro. Esta é uma mancha que há-de sempre existir. Imaginem o que seria os portugueses acordarem um dia e darem-se conta que um povo estrangeiro andou pouco a pouco a comprar as serranias queimadas, os baldios abandonados, a instalar-se; que um dia vêm mais, muitos mais, e dizem-nos que eles eram lusitanos há 3000 anos, que esta terra era deles muito antes de nós, que nós não sabemos amar este rectângulo, que eles têm direitos históricos e de melhor guardião. Que fariamos nós? Imaginem que os espanhóis resolvem guerrear esse outro povo, porque afinal nós somos mais como eles, e nós rejubilamos e ajudamos, mas a guerra é perdida. Estamos desalojados nas fronteiras e agora os espanhóis fecham-nos as portas, recusam-se a dar-nos guarida e Portugal já não é nosso. Somos deixados num limbo.
Este povo foi varrido porque não entendeu que uma culpa enorme esmagava a Europa e evitou o bom senso, porque não entendeu que para os outros árabes eles são somente carne para canhão, porque sendo fatalmente humanos têm a arreigada noção do Eles e Nós. Por este povo trágico eu choro.
Como hoje sou mais velha e experiente, eu sei hoje que há feridas que para se curarem devem ser esquecidas. Eu hoje sei que Israel é. Tento entender a força que construiu este país. Que fracção é também culpa minha, na minha linha de ascendência católica.
Paz. Têm de haver mais pessoas a desejarem a paz e a olhar os outros com a mesma generosidade com que olham os seus. Nós e eles. Nós e eles. Nós e eles. Não sei. Nem sei se na verdade se encontraram os extremos do nó, para que se possa lentamente, mas em desenlaces seguros, destrinçar o emaranhado.
sexta-feira
Está tudo bem em Hamburgo!
Hamburgo é uma cidade muito policiada. Uma pessoa acaba por integrá-los na paisagem, os uniformes verde-tropa para a polícia de choque, o verde-sapo para a polícia motoqueira, os novíssimos uniformes pretos para a polícia citadina (dizem que são azul-escuro e até são, mas para verificar tal facto tive de enfiar o nariz no uniforme de um policial, que não achou muita piada ao meu ataque miópico). Ontem à noite (contaram-me, que eu ando sempre às avessas nestas coisas. Esperemos que continue [eu às avessas].) era impossível não os ver. O centro da cidade, especialmente as estações de metro foram tomadas de assalto. Caça ao homem.
Depois de me contarem isto, corri pró meu computador e puxei a página internética do jornal da cidade: nada. Umas pistas, uns homens a falar árabe e com uma mochila, uma testemunha credível que diz que estavam a juntar as palavras "Herói" e "Alá", umas denúncias. Os estrangeiros preguiçosos (incluindo eu) andamos a limpar o pó às bicicletas, mas anuncio que cá pra mim é somente o célebre exagero policial de Hamburgo que continua. [Sim, neste caso é capaz de ser melhor que exagerem.]
Murconices
Alguém pensaria que pegando-se num poema de Eugénio de Andrade se pudesse acrescentar brilho? Pois o Murcon fê-lo. Agora uma palavra batida em grito maior: EXCELENTE!
quinta-feira
Ode
No dia das bruxas
correu meio mundo
sem ver o medo
morreu de terror.
Caiu para o lado
estrebuchou miasmas
feito num oito
desligou o motor.
correu meio mundo
sem ver o medo
morreu de terror.
Caiu para o lado
estrebuchou miasmas
feito num oito
desligou o motor.
A encarnação do autarca
O presidente da Câmara de Coimbra mostra claramente os sintomas de alguém a coleccionar razões para explicar que dos seus serviços não houve qualquer culpa. São tantas as razões que se percebe que ele só pensou no assunto nos últimos dias.
A lei ainda não foi regulamentada. [pergunto-me quem é que tem que regulamentar a lei.]. Não chega? O Sr. presidente passa à segunda fase, o escárnio: A lei é estúpida. Então meus senhores querem que eu ande a cortar os jardins das pessoas? . Chiça! Ainda não chega?! Eu estive a ler aquilo à pressa, mas do pouco que percebi chegou pra saber que há um organismo qualquer que deve fazer algo no caso dos serviços da Câmara nada fazerem! E ELES NÃO FIZERAM! . Já no plano de fuga: Não fomos só nós! Nenhuma Câmara do país se portou melhor!
Não é adorável a mentalidade autárquica?
A lei ainda não foi regulamentada. [pergunto-me quem é que tem que regulamentar a lei.]. Não chega? O Sr. presidente passa à segunda fase, o escárnio: A lei é estúpida. Então meus senhores querem que eu ande a cortar os jardins das pessoas? . Chiça! Ainda não chega?! Eu estive a ler aquilo à pressa, mas do pouco que percebi chegou pra saber que há um organismo qualquer que deve fazer algo no caso dos serviços da Câmara nada fazerem! E ELES NÃO FIZERAM! . Já no plano de fuga: Não fomos só nós! Nenhuma Câmara do país se portou melhor!
Não é adorável a mentalidade autárquica?
quarta-feira
Irracionalidades
Estou a ouvir os Coldplay. Gosto apaixonadamente. Não faço apreciações, pois o facto da música deles me parar em melancolia é só sentimento sem pensamento. Pára-se-me o cérebro e deixo-me ir, recomeço a pensar em arranques de motor engasgado e escrevo por escrever algo... sem sentido... sem direcção... sem utilidade... Quando o CD acabar retorno da submersão.
Dúvidas
Há dias em que matuto nesta coisas. Ontem no Público vinha o resultado de um inquérito para definir a percepção de felicidade em vários países europeus. Para lá de confirmar que os portugueses são uns queixinhas, os escandinavos são mentirosos ou estavam bêbados na altura do inquérito e que os latinos são uma cambada de invejosos, pensa-se "mas isto serve para alguma coisa?". Haverá algum programa europeu para animar os pessimistas? Algum subsídio de demoção da inveja? Será para ajudar os publicitários a planear as campanhas? E afinal se estão tão felizes porque é que os escandinavos se matam?
terça-feira
O povo
Diz-se que o povo tem o governo que merece. Portugal de certeza não merece este povo. É que nem o governo merece isto. Sócrates deve estar a pensar: quem me dera a bicharada do Quénia!
Foguetes animam festas enquanto fogos alastram
Foguetes animam festas enquanto fogos alastram
segunda-feira
Parabéns atrasados
Querido diário: um mês contigo! Tenho-me divertido. Escrever um diário assim tem muito mais piada. Além de que não deixa de ser secreto. Quem é que me descobre aqui? Qual a hipótese de alguém que me conheça de esbarrar aqui? Consoante o humor posso armar-me em professora, em intelectual, posso falar dos livros que leio, escrever os meus poemas destalentados, inventar palavras, escrever por escrever e na maior das latas publicar para o mundo! Eu adoro isto!
Agora que estou por dentro tenho reparado em coisas que antes, somente como leitora de blogues, me passavam despercebidas. Os bloguistas são narcisistas. Mas bués! O Narciso ao pé desta gente é asceta. Descobri que usam "sitemeters", que dão informações até da resolução do teu monitor, e motores de busca só para a blogosfera e que localizam os visitantes no mundo e... Um dia destes estou a ler um blogue e estão a tirar-me a fotografia de satélite! É arrepiante!
Confesso, confesso, eu fiz o mesmo! Eu instalei uma coisa parecida. Um calhambeque, mas confesso que vou ver se alguém cá veio. E confesso que adoro ver o mapa-mundo com umas poucas luzitas... Não é a sério, juro! É curiosidade. Não, não! Eu não vejo a resolução dos monitores! É pouca gente. Isto continua basicamente a ser uma coisa entre tu e eu, i.e., eu e eu. E a J. Olá J.! :-)
Sim, eu contei à J. Sabes como ela é. Uma chantagista emocional! Eu tive de lhe dizer que tenho um blogue! Assim até é melhor. Controlo as asneiras e não há referências àquilo... Aquilo! Aquela cena... Pois...
Olha, parabéns!
Agora que estou por dentro tenho reparado em coisas que antes, somente como leitora de blogues, me passavam despercebidas. Os bloguistas são narcisistas. Mas bués! O Narciso ao pé desta gente é asceta. Descobri que usam "sitemeters", que dão informações até da resolução do teu monitor, e motores de busca só para a blogosfera e que localizam os visitantes no mundo e... Um dia destes estou a ler um blogue e estão a tirar-me a fotografia de satélite! É arrepiante!
Confesso, confesso, eu fiz o mesmo! Eu instalei uma coisa parecida. Um calhambeque, mas confesso que vou ver se alguém cá veio. E confesso que adoro ver o mapa-mundo com umas poucas luzitas... Não é a sério, juro! É curiosidade. Não, não! Eu não vejo a resolução dos monitores! É pouca gente. Isto continua basicamente a ser uma coisa entre tu e eu, i.e., eu e eu. E a J. Olá J.! :-)
Sim, eu contei à J. Sabes como ela é. Uma chantagista emocional! Eu tive de lhe dizer que tenho um blogue! Assim até é melhor. Controlo as asneiras e não há referências àquilo... Aquilo! Aquela cena... Pois...
Olha, parabéns!
Sentimento de segunda
Kazimir Malevich. Auto-retrato em duas dimensões 1915
É segunda-feira, granda porra, mas está SOL, de Verão, daquele que até faz suar um pouquinho... Fantástico! Mesmo assim sinto-me um pouco como o Malevich... Esta abstracção em duas dimensões ainda me há-de matar...
É segunda-feira, granda porra, mas está SOL, de Verão, daquele que até faz suar um pouquinho... Fantástico! Mesmo assim sinto-me um pouco como o Malevich... Esta abstracção em duas dimensões ainda me há-de matar...
domingo
A inteligência de Deus
Ainda sobre a Concepção Inteligente (CI), ou melhor, os seus apoiantes, fui desencantar o excerto de uma carta de um leitor da "New Scientist" de 9 de Julho de 2005. Na altura achei a questão do Sr. Vasudev Godbole perspicaz.
Porque é que as pessoas têm a necessidade de adoptar este tipo de pontos de vista?
Um engenheiro que construa um avião que voe de Londres a Nova Iorque sem piloto é mais inteligente que um engenheiro cujo avião necessite de piloto. Contudo, os passageiros provavelmente sentir-se-ão melhor viajando no segundo tipo de avião. Da mesma forma, o Deus que crie a evolução sem necessidade de mais intervenção é mais inteligente que o Deus cuja criação necessite de supervisão e manutenção constante. Talvez as pessoas se sintam mais amadas pelo segundo tipo de Deus e, proveniente de um sentimento de gratidão, declaram que este é o mais inteligente.
Este problema psicológico está na raiz da maior parte da hostilidade dirigida aos evolucionistas pelos apoiantes da CI. (...) "Como se atrevem a negar ou a comportarem-se com ingratidão para com um Deus protector?" - esta é a questão amarga que eles fazem. Estão 110% seguros de que o Deus que intervém a cada meia hora é mais carinhoso e protector que O que só intervém no infinito. No âmago psicológico dos apoiantes da CI isto é que os motiva e impulsiona para a ridicularização e demonização dos evolucionistas.
Porque é que as pessoas têm a necessidade de adoptar este tipo de pontos de vista?
Um engenheiro que construa um avião que voe de Londres a Nova Iorque sem piloto é mais inteligente que um engenheiro cujo avião necessite de piloto. Contudo, os passageiros provavelmente sentir-se-ão melhor viajando no segundo tipo de avião. Da mesma forma, o Deus que crie a evolução sem necessidade de mais intervenção é mais inteligente que o Deus cuja criação necessite de supervisão e manutenção constante. Talvez as pessoas se sintam mais amadas pelo segundo tipo de Deus e, proveniente de um sentimento de gratidão, declaram que este é o mais inteligente.
Este problema psicológico está na raiz da maior parte da hostilidade dirigida aos evolucionistas pelos apoiantes da CI. (...) "Como se atrevem a negar ou a comportarem-se com ingratidão para com um Deus protector?" - esta é a questão amarga que eles fazem. Estão 110% seguros de que o Deus que intervém a cada meia hora é mais carinhoso e protector que O que só intervém no infinito. No âmago psicológico dos apoiantes da CI isto é que os motiva e impulsiona para a ridicularização e demonização dos evolucionistas.
sexta-feira
Afixe: o desaire do pensamento
A zanzar pela blogosfera e dou com este texto n'A barriga de um arquitecto emanado deste texto no Afixe.
Assunto: a última aberração americana: apoio governamental ao ensino de uma especulação metafísica (a Concepção Inteligente, uma "prima melhorada" do velho Criacionismo) lado a lado com uma teoria racional (teoria da Evolução Natural) em aulas de Ciência. Eu por duas vezes abordei este assunto, uma vez para clarificar Conceitos e outra vez para falar da brincadeira séria de um desempregado que exigia o ensino numa escola americana da Teoria do monstro esparguete, que ele afirmava tão meritória como a Concepção Inteligente.
O Afixe começa a derrapar logo no início da sua reflexão com o "ponhamos as duas teorias (e sublinho a palavra teorias) lado a lado...". Pode-se aplicar a palavra teoria aos dois sistemas, mas esta palavra terá uma conotação diferente. Esta diferença é fundamental. De um lado especulações sem qualquer fundamento, para lá de fé; do outro um sistema racional, empírico, que desde o momento em que Darwin (1858, penso) traçou as primeiras pinceladas tem acumulado provas científicas e aperfeiçoando-se como sistema explicativo. Este aperfeiçoar significa explicar melhor. As teorias científicas, incluindo esta, têm as suas lacunas, as suas áreas de sombra. Isto porque são uma constante busca de conhecer o mundo que nos rodeia, porque esse mundo é complexo, porque nós seres humanos não somos perfeitos, omnipotentes ou omniscientes. Aos cientistas isto não mete medo nenhum. É nestes buracos do conhecimento que um cientista labuta.
O histerismo dos evolucionistas, de que fala o Afixe, advém da desonestidade na discussão. Argumentar não é estranho para os cientistas, mas o tipo de argumentação que é feito é desonesto. O cientista não pode tentar provar ou desprovar Deus. O cientista testa e pensa e experimenta no racional e mensurável, porque só aí se pode criar conhecimento. Para lá disto é convicção. Discutir convicções é como discutir os gostos de cada um. Ver convicções a receber o mesmo aval que uma teoria testada inúmeras vezes até ter tal credibilidade que é ensinada nas escolas, é de pôr qualquer pessoa intelectualmente honesta em ataques de histerismo.
O Afixe comete outro erro crasso. O pensar que a Ciência desalojou Deus. Há cientistas ateus, mas há muitos que sentem no mundo um lado divino. Esse sentimento não é eliminado pelo seu trabalho, mas até alimentado. Ao conhecerem melhor o mecanismo que roda o mundo não conseguem deixar de se maravilhar pela sua beleza e harmonia. Há um milagre numa cadeia de ADN, uma subtileza na sua simplicidade criadora de complexidade. Há um tremor sublime quando se olha uma estrela e não é por se saber a distância à Terra e a sua constituição, que diminui a sua existência fantástica. Quanto mais se aprende, mais se respeita, mais se ama, mais se contempla o que está para lá dos nossos sentidos. Quem será? Talvez Deus. Para conhecer é necessário um método e um intelecto rigoroso. Mas depende de cada um o deslumbramento.
Se o Afixe se sente atrofiado pela ciência e o seu materialismo, pode acreditar no que quiser, direito dele, mas não se pode aceitar misturar no mesmo pacote uma especulação metafísica e uma teoria cientifíca como se fossem duas faces de uma mesma moeda. Se querem ensinar a Concepção Inteligente nas escolas, façam-no, mas em aulas de Religião ou Especulação ou Sonhos. Numa aula de ciência ensina-se ciência, numa aula de biologia ensina-se o estudo racional da vida. Finalmente deve-se informar os alunos claramente dos fundamentos e métodos do que lhes é ensinado: a primeira é gente que pensa, definindo um pensamento, que perdura em cogitação sem prova; na segunda gente que pensa e que demonstra a outro pensante, que repensa e testa, num ciclo que retém as partes do pensamento que sobrevivem às argumentações e testes de muita gente a pensar e a testar livremente na mesma coisa. Estás a ver Afixe?
Assunto: a última aberração americana: apoio governamental ao ensino de uma especulação metafísica (a Concepção Inteligente, uma "prima melhorada" do velho Criacionismo) lado a lado com uma teoria racional (teoria da Evolução Natural) em aulas de Ciência. Eu por duas vezes abordei este assunto, uma vez para clarificar Conceitos e outra vez para falar da brincadeira séria de um desempregado que exigia o ensino numa escola americana da Teoria do monstro esparguete, que ele afirmava tão meritória como a Concepção Inteligente.
O Afixe começa a derrapar logo no início da sua reflexão com o "ponhamos as duas teorias (e sublinho a palavra teorias) lado a lado...". Pode-se aplicar a palavra teoria aos dois sistemas, mas esta palavra terá uma conotação diferente. Esta diferença é fundamental. De um lado especulações sem qualquer fundamento, para lá de fé; do outro um sistema racional, empírico, que desde o momento em que Darwin (1858, penso) traçou as primeiras pinceladas tem acumulado provas científicas e aperfeiçoando-se como sistema explicativo. Este aperfeiçoar significa explicar melhor. As teorias científicas, incluindo esta, têm as suas lacunas, as suas áreas de sombra. Isto porque são uma constante busca de conhecer o mundo que nos rodeia, porque esse mundo é complexo, porque nós seres humanos não somos perfeitos, omnipotentes ou omniscientes. Aos cientistas isto não mete medo nenhum. É nestes buracos do conhecimento que um cientista labuta.
O histerismo dos evolucionistas, de que fala o Afixe, advém da desonestidade na discussão. Argumentar não é estranho para os cientistas, mas o tipo de argumentação que é feito é desonesto. O cientista não pode tentar provar ou desprovar Deus. O cientista testa e pensa e experimenta no racional e mensurável, porque só aí se pode criar conhecimento. Para lá disto é convicção. Discutir convicções é como discutir os gostos de cada um. Ver convicções a receber o mesmo aval que uma teoria testada inúmeras vezes até ter tal credibilidade que é ensinada nas escolas, é de pôr qualquer pessoa intelectualmente honesta em ataques de histerismo.
O Afixe comete outro erro crasso. O pensar que a Ciência desalojou Deus. Há cientistas ateus, mas há muitos que sentem no mundo um lado divino. Esse sentimento não é eliminado pelo seu trabalho, mas até alimentado. Ao conhecerem melhor o mecanismo que roda o mundo não conseguem deixar de se maravilhar pela sua beleza e harmonia. Há um milagre numa cadeia de ADN, uma subtileza na sua simplicidade criadora de complexidade. Há um tremor sublime quando se olha uma estrela e não é por se saber a distância à Terra e a sua constituição, que diminui a sua existência fantástica. Quanto mais se aprende, mais se respeita, mais se ama, mais se contempla o que está para lá dos nossos sentidos. Quem será? Talvez Deus. Para conhecer é necessário um método e um intelecto rigoroso. Mas depende de cada um o deslumbramento.
Se o Afixe se sente atrofiado pela ciência e o seu materialismo, pode acreditar no que quiser, direito dele, mas não se pode aceitar misturar no mesmo pacote uma especulação metafísica e uma teoria cientifíca como se fossem duas faces de uma mesma moeda. Se querem ensinar a Concepção Inteligente nas escolas, façam-no, mas em aulas de Religião ou Especulação ou Sonhos. Numa aula de ciência ensina-se ciência, numa aula de biologia ensina-se o estudo racional da vida. Finalmente deve-se informar os alunos claramente dos fundamentos e métodos do que lhes é ensinado: a primeira é gente que pensa, definindo um pensamento, que perdura em cogitação sem prova; na segunda gente que pensa e que demonstra a outro pensante, que repensa e testa, num ciclo que retém as partes do pensamento que sobrevivem às argumentações e testes de muita gente a pensar e a testar livremente na mesma coisa. Estás a ver Afixe?
Adeusinho
O Aviz acabou. Nos últimos tempos perdi alguns dos blogues que se me tornou hábito acompanhar, muito antes de eu ter este canto. No tempo em que eu estaria na mesma a pensar nisto, mas em que não o escreveria aqui. Se o escrevesse acabaria nas costas de um relatório, de um daqueles papéis chatos da administração, na melhor das sortes no meu caderno de notas, entre o relembrar de ir às compras e aquela tarefa chata para sempre rescrita e esquecida. Desculpem, estou a divagar, a fazer gincana ao adeus.
Obrigado pelos dias em que o meu bom dia foi a página do Aviz, obrigado por ter sido o cais de partida para os outros blogues e um obrigado muito, muito especial pela descoberta, para mim, de Edward Hopper. Boas escritas.
quinta-feira
Graças pelo 1 de Dezembro de 1640
Tomei o cafézinho do almoço na companhia de três colegas espanhóis: um basco, uma madrilena e uma sevilhana. Entre eles discutiam o terrorismo e outros atritos menos perigosos entre as regiões espanholas. Comigo ali, eles começaram a explicar-me as camadas, os intrincados desta luta interna, ajudando-me quando eu me perdia no castelhano. O basco contou a atmosfera pesada da sua região, como não existe a liberdade para desfrutar do prazer da sua língua ou cultura antigas, pois é sempre, sempre tomar uma posição pró-ETA, o que não se quer, nem se pode desfrutar do que é castelhano, que é sempre uma posição contra-ETA, o que também é mau e em situações limite incluí despesas de guarda-costas. Explicaram-me o egoísmo de Catalunha, os braços de ferro e o quase racismo de várias discussões. Explicaram-me como tudo é politizado em Espanha, até a bandeira, que sendo antiga foi adoptada por Franco e agora é um símbolo de nacionalismo e facismo para muita gente, em vez de um símbolo do país. A certa altura apanhei-me a dar graças pelo 1 de Dezembro de 1640...
quarta-feira
A queda de Hitler
Acabei de ler "Downfall - Until the final hour", um livro de Traudl Junge com Melissa Mueller. A primeira foi uma das secretárias de Adolf Hitler durante dois anos e meio até ao suicídio do ditador e à queda da Alemanha. Com base neste livro, um filme foi realizado no ano passado e esteve nomeado nos Óscars para melhor filme estrangeiro.
O filme é alemão ("Der Untergang"), mas apesar do meu conhecimento em alemão ser tal que eu compreenderia metade, ainda assim, caso fosse este o impedimento, poderia ter visto o filme, já que esteve num cinema perto de mim com legendas em inglês. Mas não fui e senti que não podia ir. Não, de forma alguma eu não me queria colocar numa situação em que qualquer sentimento de compreensão, piedade, empatia, por minúsculo que fosse (ainda que quem ali estivesse fosse um actor excepcional, ou talvez exactamente por ser Bruno Ganz) surgisse por Hitler. Um homem moralmente miserável, um homem magnético que com esse poder começou o resvalar de tal horror que assombrará a Europa por muito tempo. Um homem... Foi repulsa instintiva, foi medo de contaminação.
O livro meteu menos medo, pois o controle da imaginação é mais conseguido se não existir a imagem num filme, que entrando pelos olhos, atinge directo, sem contexto e cru, àqueles instintos básicos. Os que olhando para um ser humano em sofrimento condoem-se.
Hitler pelos olhos de uma jovem secretária. A oportunidade de perceber o magnetismo que esse homem, aparentemente de aparência ridícula, produzia nos que o cercavam. Traudl Junge escreveu sobre o seu convívio com Hitler logo após a derrota alemã, aos 27 anos. Numa altura em que: "Era maravilhoso viver sob a democracia americana. Não me tinha apercebido de que não ouvia música de compositores polacos ou russos, que não podia ler literatura de autores judeus... que tanto tinha sido banido ou era tabu. De repente o mundo intelectual abriu-se novamente. Em Munique os teatros e os cabarés reabriam... Na verdade existia uma nova sensação de vida no ar. A profecia de Hitler do fim da Alemanha e do retorno do país às sua origens agrárias não se concretizou... Claro, os americanos trouxeram a sua música... e os seus autores. Hemingway, por exemplo. Na altura, tinhamos de mourejar e poupar, mas a vida era gratificante."
Tinha 22 anos ao entrar ao serviço de Hitler. A sua escrita é geralmente descritiva, distante, ingénua. Diz Traudl Junge que mais tarde, ao reler, sentiu-se zangada consigo própria pela quase ausência de auto-crítica. Contudo, para mim foi interessante, talvez mais informativo do que um texto a pedir desculpas, numa auto-censura que me deixaria incerta sobre a honestidade nos acontecimentos descritos. Ao escrever sobre o seu primeiro encontro com Hitler: "Nós entramos na sala, que era enorme, e colocamo-nos à frente da secretária. Hitler veio ao nosso encontro sorrindo, ergueu o braço lentamente em saudação e seguidamente apertou a mão a cada uma de nós. A sua voz era profunda e cheia ao perguntar-nos o nome e de onde vinhamos. Eu fui a última e era a única de Munique. Ele perguntou a minha idade de novo, sorriu uma vez mais, voltou o olhar penetrante sobre todas nós, elevou o braço em saudação pela segunda vez - e fomos mandadas embora sem pelo menos termos tido a oportunidade de pronunciarmos o nosso "Heil, mein Fuehrer". Fora, o feitiço quebrou-se e pudemos relaxar por fim. Comentamos a forma como ele apertava as mãos, o seu olhar fascinante, a sua figura e todos os outros pormenores que nos pareceram tão significantes neste encontro importante."
Num dos poucos momentos de análise: "Eu tinha entrado neste meio [o espaço de vivência de Hitler] com tão poucos pré-conceitos e ideias pré-concebidas que eu suguei a atmosfera de positivismo que me envolvia como um bebé suga o leite da mãe. Desde o fim da guerra que frequentemente me questiono como foi possível não ter nunca tido quaisquer reservas ao contactar com aquelas pessoas. Então lembro-me que a barreira e o arame farpado também nos separavam de quaisquer dúvidas, rumores ou diferentes opiniões políticas do exterior; dou-me conta de que eu não tinha pontos de comparação e não podia ter sentido conflitos. Quando comecei a trabalhar para o Fuehrer (...) Julius Schaub disse-me que eu não podia discutir o meu trabalho com ninguém e eu sabia que estas ordens eram dadas a todos, desde o soldado ao general."
O livro contém um prefácio e um posfácio que mostram também a tarefa penosa do relembrar e do remorso e acaba com Traudl Junge: "Hoje eu estou de luto por duas coisas: pelo destino dos milhões de pessoas que foram assassinadas pelos Nazis. E por aquela rapariguinha a quem lhe faltava a confiança e o bom senso para falar contra eles no momento certo."
Achei o livro interessantíssimo pelo que me revelou sobre como uma rapariga alemã pensou (ou melhor, como não pensou) e como viveu junto a Hitler, perceber que tipo de poder, de imagem tinha este homem sobre as pessoas comuns, que tipo de pessoas conviviam com ele. Tentar perceber a cegueira e como evitar um mal deste tipo.
Nota: as traduções são minhas do inglês.
terça-feira
Desperança
Escrevi a entrada "Israel & Palestina" ontem, mas já hoje parece-me ingénua e absurda.
Ontem, noite de cinema em casa de amigo, trouxe à baila a retirada dos colunatos.
A - Uma mulher com um bebé, expunha-o e pedi-a que parassem a expulsão.
B - São pessoas que perdem tudo.
A - Eu compreendo que perdem muito, mas eu não aceito chantagem emocional. Eu não posso simpatizar com o uso de crianças para resolver este tipo de situações.
C - Eles deveriam ter compreendido que estão no sítio errado. Que a sua presença naqueles territórios exacerbou ódios e intolerâncias. É culpa deles.
B - Esta é a solução: construir um muro e separar os israelitas dos palestinianos.
A - Construir o muro!? Construíram um muro a separar as duas alemanhas! Achas que foi bem?
B - Resultou, não?
C - Isso não é a solução. Tem que se melhorar as condições de vida dos palestinianos! Só assim deixarão de ter tantos extremistas entre a população!
B - A Faixa de Gaza é um deserto. Não é possível albergar o milhão de refugiados palestinianos de forma a que tenham uma vida decente. Não é possível. Os países árabes não ajudam, pelo contrário, é-lhes vantajoso manter as pessoas sem futuro. A solução é um muro alto e enorme.
C - De um lado uns que têm o poder militar, as costas quentes para fazerem o que querem; do outro uns estúpidos coitados ensanduíchados entre o ódio dos outros e cegos pelo seu próprio ódio e desespero.
B - A solução é a separação física dos dois.
Este é o plano, este é o futuro. Ariel Sharon, a raposa, prepara o terreno para separar definitivamente eles deles. Não querendo um estado binacional, não podendo ter tudo, quer pelo menos definir bem o que pode assegurar agora, usando o "facts on the ground" para acabar de traçar o seu muro vantajosamente. Só ontem me dei conta disto.
Ontem, noite de cinema em casa de amigo, trouxe à baila a retirada dos colunatos.
A - Uma mulher com um bebé, expunha-o e pedi-a que parassem a expulsão.
B - São pessoas que perdem tudo.
A - Eu compreendo que perdem muito, mas eu não aceito chantagem emocional. Eu não posso simpatizar com o uso de crianças para resolver este tipo de situações.
C - Eles deveriam ter compreendido que estão no sítio errado. Que a sua presença naqueles territórios exacerbou ódios e intolerâncias. É culpa deles.
B - Esta é a solução: construir um muro e separar os israelitas dos palestinianos.
A - Construir o muro!? Construíram um muro a separar as duas alemanhas! Achas que foi bem?
B - Resultou, não?
C - Isso não é a solução. Tem que se melhorar as condições de vida dos palestinianos! Só assim deixarão de ter tantos extremistas entre a população!
B - A Faixa de Gaza é um deserto. Não é possível albergar o milhão de refugiados palestinianos de forma a que tenham uma vida decente. Não é possível. Os países árabes não ajudam, pelo contrário, é-lhes vantajoso manter as pessoas sem futuro. A solução é um muro alto e enorme.
C - De um lado uns que têm o poder militar, as costas quentes para fazerem o que querem; do outro uns estúpidos coitados ensanduíchados entre o ódio dos outros e cegos pelo seu próprio ódio e desespero.
B - A solução é a separação física dos dois.
Este é o plano, este é o futuro. Ariel Sharon, a raposa, prepara o terreno para separar definitivamente eles deles. Não querendo um estado binacional, não podendo ter tudo, quer pelo menos definir bem o que pode assegurar agora, usando o "facts on the ground" para acabar de traçar o seu muro vantajosamente. Só ontem me dei conta disto.
segunda-feira
Israel & Palestina
Leio apreensiva as notícias sobre a retirada dos colonos israelitas. Apreensão pelo hoje e pelo amanhã. O desejo do começo de um final feliz e o medo de que tudo se esboroe. No meio dos meus pensamentos surgiu "Romeu e Julieta". Primeiro pensei "Que raio de intrusão mais pateta".
Duas casas, iguais em dignidade (...) reactivaram antiga inimizade, manchando mãos fraternas sangue irmão. Do fatal seio desses dois rivais um par nasceu de amantes desditosos, que em sua sepultura o ódio dos pais depuseram, na morte venturosos.
Depois pareceu-me natural. No meio da violência do ódio quantos justos perecerão? Entre eles a paz. E tal como na peça eu sofro. Tenho medo do final, tenho medo dos extremistas, tenho medo dos fundamentalistas, tenho medo dos ódios enraizados, tenho medo da intolerância e tenho tanta esperança que me sufoca. Eu na peça sabia o final, aqui comporto-me como se soubesse. Quero tanto estar enganada. Tanto, tanto.
Duas casas, iguais em dignidade (...) reactivaram antiga inimizade, manchando mãos fraternas sangue irmão. Do fatal seio desses dois rivais um par nasceu de amantes desditosos, que em sua sepultura o ódio dos pais depuseram, na morte venturosos.
Depois pareceu-me natural. No meio da violência do ódio quantos justos perecerão? Entre eles a paz. E tal como na peça eu sofro. Tenho medo do final, tenho medo dos extremistas, tenho medo dos fundamentalistas, tenho medo dos ódios enraizados, tenho medo da intolerância e tenho tanta esperança que me sufoca. Eu na peça sabia o final, aqui comporto-me como se soubesse. Quero tanto estar enganada. Tanto, tanto.
domingo
O elefante desaparece
Continuo a ler o "The elephant vanishes" do Haruki Murakami. Ontem à noite aninhei-me no sofá com as mantas quentes a abraçarem-me, uma caneca de chá quente na mesinha, o som da chuva na janela, as pernas estiradas e mergulhei no livro até às 6 da manhã. Por duas vezes adormeci e acordei ainda com o livro perfeitamente aberto à frente do meu nariz e continuei como se nada fosse, sem quebra. Talvez porque o sonhar parece mesmo uma linha conducente ao livro.
Now my inability to sleep ceased to frighten me. What was there to be afraid of? Think of the advantages! Now the hours from ten at night to six in the morning belonged to me alone. Until now, a third of every day had been used up by sleep. But no more. No more. Now it was mine, just mine, nobody else's, all mine. I could use this time in any way I liked. No one would get in my way. No one would make demands on me. Yes, that was it. I had expanded my life. I had increased it by a third.
You burn barns. I don't burn barns. There's this glaring difference, and to me, rather than say which of us is strange, first of all I'd like to clear up just what that difference is.
Needless to say, the manufacture of elephants is no easy matter. They're big, first of all, and very complex. It's not like making hairpins or colored pencils.(...) Assigned to the ear section that month, I worked in the building with the yellow ceiling and posts. My helmet and pants were also yellow. All I did there was make ears. The month before, I had been assigned to the green building, where I wore a green helmet and pants and made heads. We moved from section to section each month, like Gypsies. It was company policy. That way, we could all form a complete picture of what an elephant looked like.
I don't know what nonsense Aoki was peddling, but everyone bought it. I didn't even want to know what the story was; I knew it was dirt. No one in the entire school would speak to me. As if by consensus - it had to be - I got the silence treatment.(...) "People who go through a heavy experience like that are changed men, like it or not,"he said."They change for the better and they change for the worse. On the good side, they become unshakable. Next to that half year, the rest of the suffering I've experienced doesn't even count. I can put with almost anything. And I also am a lot more sensitive to the pain of people around me. That's on the plus side. It made me capable of making some real friends. But there's also the minus side. I mean, it's impossible, in my own mind, to believe in people."
"The elephant vanishes" do Haruki Murakami.
Now my inability to sleep ceased to frighten me. What was there to be afraid of? Think of the advantages! Now the hours from ten at night to six in the morning belonged to me alone. Until now, a third of every day had been used up by sleep. But no more. No more. Now it was mine, just mine, nobody else's, all mine. I could use this time in any way I liked. No one would get in my way. No one would make demands on me. Yes, that was it. I had expanded my life. I had increased it by a third.
You burn barns. I don't burn barns. There's this glaring difference, and to me, rather than say which of us is strange, first of all I'd like to clear up just what that difference is.
Needless to say, the manufacture of elephants is no easy matter. They're big, first of all, and very complex. It's not like making hairpins or colored pencils.(...) Assigned to the ear section that month, I worked in the building with the yellow ceiling and posts. My helmet and pants were also yellow. All I did there was make ears. The month before, I had been assigned to the green building, where I wore a green helmet and pants and made heads. We moved from section to section each month, like Gypsies. It was company policy. That way, we could all form a complete picture of what an elephant looked like.
I don't know what nonsense Aoki was peddling, but everyone bought it. I didn't even want to know what the story was; I knew it was dirt. No one in the entire school would speak to me. As if by consensus - it had to be - I got the silence treatment.(...) "People who go through a heavy experience like that are changed men, like it or not,"he said."They change for the better and they change for the worse. On the good side, they become unshakable. Next to that half year, the rest of the suffering I've experienced doesn't even count. I can put with almost anything. And I also am a lot more sensitive to the pain of people around me. That's on the plus side. It made me capable of making some real friends. But there's also the minus side. I mean, it's impossible, in my own mind, to believe in people."
"The elephant vanishes" do Haruki Murakami.
sábado
Relatividade excêntrica
O meu livro de cabeceira é "The elephant vanishes" de Haruki Murakami. É um livro de contos que me foi aconselhado por um amigo relativista. Este meu amigo é matemático. É completamente incapaz de entender o mundo real a três dimensões. Ele perder-se-ia numa área citadina de 20 m2. Irremediavelmente. Acha muito complicado entender a realidade. Não consegue digerir a noção que há mais mundo para além do que ele vê. Ele sabe pelos jornais e a televisão e..., que existe mais mundo, mas parece-lhe tudo muito estranho. Sobre a vida a sua atitude é de que nunca nos devemos ralar. A vida deve ser tomada como vem... Para finalizar: é um aficcionado de Harry Potter (tirou dia livre quando recebeu o último livro pela Amazon). Uma figura. No trabalho é brilhante. Fica-se um pouco perplexo que fórmulas, métodos matemáticos, técnicas de programação que nos deixam completamente perdidos ele compreende instantaneamente, mas precisa de um de nós normalecos para não se perder na estação de comboios.
Agora pensem que tipo de livro (na categoria: para adultos e com um nível literário acima do medíocre) uma pessoa destas iria gostar. Pois: "The elephant vanishes" de Haruki Murakami. Tudo ele.
Situações estranhas no quotidiano rotineiro, pardacento, confortável. Mas a estranheza não vem do próprio mundo, mas das personagens. Como o meu amigo matemático, o mundo não lhes parece real.
Agora só pra ser marota esta citação do livro: "A long, flimsy tin sign arching its sickly spine like an anal-sex enthusiast". [minha tradução: um sinal de latão longo e flexível arqueia a espinha doentia como um entusiasta de sexo anal.].
Agora pensem que tipo de livro (na categoria: para adultos e com um nível literário acima do medíocre) uma pessoa destas iria gostar. Pois: "The elephant vanishes" de Haruki Murakami. Tudo ele.
Situações estranhas no quotidiano rotineiro, pardacento, confortável. Mas a estranheza não vem do próprio mundo, mas das personagens. Como o meu amigo matemático, o mundo não lhes parece real.
Agora só pra ser marota esta citação do livro: "A long, flimsy tin sign arching its sickly spine like an anal-sex enthusiast". [minha tradução: um sinal de latão longo e flexível arqueia a espinha doentia como um entusiasta de sexo anal.].
quinta-feira
Praguejamento
Hoje está a ser um mau dia. Após três artigos no Público que me enfureceram por:
1) incorrecto no conteúdo e tendencioso (esta última já é normal, mas sinto que hoje estou com menos paciência para certas m*****);
2) completamente mal escrito, tornando-se pouco compreensível;
3) bem, neste o Público não tem culpa. É simplesmente a notícia que me dá vontade de vomitar.
Recebo esta ligação à página do futuro Centro de Estágios do S.L. Benfica.
Pior que ter alguém a sacanear-nos é esse alguém publicitar a sacanagem. "Estou-te a lixar, ó caramujo! Vê! Olha bem! Toma! Hehehehe!"
Pois anuncia-nos o bravo S.L.B. (= sacaneamos livremente e bem) que esta necessidade do interesse público português "(...) localiza-se no Concelho de Seixal, junto ao Tejo, numa extensa área de zona protegida, da reserva ecológica nacional."
Confesso que gosto de ver futebol, mas estou a ficar tão farta desta ladroagem dos clubes sobre todos nós! É que se ainda houvesse um esforço dos clubes para promover o desporto na população! Mas não! Eles promovem o desporto de competição e para isso pagamos todos nós. Assim, pagando-lhes os Estádios, beneficiando-os e perdoando-lhes impostos e outras contribuições ao Estado, dando-lhes de bandeja locais de excelência, que deviam ser de usufruto geral, pensados para proteger o património natural de todos nós, para eles construírem um Centro de Estágios, que terá "níveis de retorno publicitário absolutamente ímpares para os seus patrocinadores". Estão a ver? Um Centro pago pelos portugueses, num local especial dos portugueses, para os portugueses continuarem a financiar, não só através das regalias estatais, mas também da publicidade! Qual o retorno para os portugueses (reais patrocinadores deste Centro?)? Nada. O povinho não entra! O povinho se quer compra binóculos. O desporto que o Benfica dá ao povinho é o seu próprio sofá, a ver na sua própria televisão, o Benfica jogar mau futebol.
Estou tão farta, tão desmoralizada, tão triste, que só me apetece...gritar....
1) incorrecto no conteúdo e tendencioso (esta última já é normal, mas sinto que hoje estou com menos paciência para certas m*****);
2) completamente mal escrito, tornando-se pouco compreensível;
3) bem, neste o Público não tem culpa. É simplesmente a notícia que me dá vontade de vomitar.
Recebo esta ligação à página do futuro Centro de Estágios do S.L. Benfica.
Pior que ter alguém a sacanear-nos é esse alguém publicitar a sacanagem. "Estou-te a lixar, ó caramujo! Vê! Olha bem! Toma! Hehehehe!"
Pois anuncia-nos o bravo S.L.B. (= sacaneamos livremente e bem) que esta necessidade do interesse público português "(...) localiza-se no Concelho de Seixal, junto ao Tejo, numa extensa área de zona protegida, da reserva ecológica nacional."
Confesso que gosto de ver futebol, mas estou a ficar tão farta desta ladroagem dos clubes sobre todos nós! É que se ainda houvesse um esforço dos clubes para promover o desporto na população! Mas não! Eles promovem o desporto de competição e para isso pagamos todos nós. Assim, pagando-lhes os Estádios, beneficiando-os e perdoando-lhes impostos e outras contribuições ao Estado, dando-lhes de bandeja locais de excelência, que deviam ser de usufruto geral, pensados para proteger o património natural de todos nós, para eles construírem um Centro de Estágios, que terá "níveis de retorno publicitário absolutamente ímpares para os seus patrocinadores". Estão a ver? Um Centro pago pelos portugueses, num local especial dos portugueses, para os portugueses continuarem a financiar, não só através das regalias estatais, mas também da publicidade! Qual o retorno para os portugueses (reais patrocinadores deste Centro?)? Nada. O povinho não entra! O povinho se quer compra binóculos. O desporto que o Benfica dá ao povinho é o seu próprio sofá, a ver na sua própria televisão, o Benfica jogar mau futebol.
Estou tão farta, tão desmoralizada, tão triste, que só me apetece...gritar....
quarta-feira
Bate bate levemente
Cantava o António Variações:
Estou bem aonde eu nao estou
Porque eu só quero ir
Aonde eu nao vou
Diz o Puto Paradoxo:
Ah!, Outubro!
As primeiras chuvas, os dias cinzentos, o tom melancólico...
Eu começo a pensar em coisas realmente feias. Os fumos de destempero esguicham-me das orelhas e tenham pena do desgraçado que tenha a má sorte de me bater à porta.
Outubro é o que vejo pela minha janela! Outubro, qual Outubro! Novembro, Dezembro (português, note-se), sem aquele cheirinho de sol, aquela promessa de aberta... Ah, o Verão em Portugal, o Outono... Concedo que Hamburgo ainda me fascina no seu verde constante, mas digamos que a chuva de tolos que mantém este verde está a começar a soar a tortura japonesa.
Quando há sol em Hamburgo parecemos todos uns sedentos esfaimados a sair do deserto. Os jardins enchem-se de corpos agradecidos, espargem-se na luz e mesmo que tenhas problemas que na noite anterior te deixaram a pregar insónia, estás-te nas tintas, há sol, o que poderá correr mal?
E o resto? Há meses que não cheiro maresia! Metade da poesia do mar desvanece sem o cheiro forte que nos desentope a alma! Aqui o mar cheira a vento frio e a molhado. Assim, frase bacoca e sem interesse. E as cores!? Onde está o azul profundo? O azul em que apetece mergulhar? Aqui o azul parece que entrou de luto.
E isto porquê? Porque aqui a idiota decidiu que não estava bem. Que devia ir ver outras coisas! Toma! Feliz? Agora ouve fado e chucha no dedo! Daqui a pouco choro...
Estou bem aonde eu nao estou
Porque eu só quero ir
Aonde eu nao vou
Diz o Puto Paradoxo:
Ah!, Outubro!
As primeiras chuvas, os dias cinzentos, o tom melancólico...
Eu começo a pensar em coisas realmente feias. Os fumos de destempero esguicham-me das orelhas e tenham pena do desgraçado que tenha a má sorte de me bater à porta.
Outubro é o que vejo pela minha janela! Outubro, qual Outubro! Novembro, Dezembro (português, note-se), sem aquele cheirinho de sol, aquela promessa de aberta... Ah, o Verão em Portugal, o Outono... Concedo que Hamburgo ainda me fascina no seu verde constante, mas digamos que a chuva de tolos que mantém este verde está a começar a soar a tortura japonesa.
Quando há sol em Hamburgo parecemos todos uns sedentos esfaimados a sair do deserto. Os jardins enchem-se de corpos agradecidos, espargem-se na luz e mesmo que tenhas problemas que na noite anterior te deixaram a pregar insónia, estás-te nas tintas, há sol, o que poderá correr mal?
E o resto? Há meses que não cheiro maresia! Metade da poesia do mar desvanece sem o cheiro forte que nos desentope a alma! Aqui o mar cheira a vento frio e a molhado. Assim, frase bacoca e sem interesse. E as cores!? Onde está o azul profundo? O azul em que apetece mergulhar? Aqui o azul parece que entrou de luto.
E isto porquê? Porque aqui a idiota decidiu que não estava bem. Que devia ir ver outras coisas! Toma! Feliz? Agora ouve fado e chucha no dedo! Daqui a pouco choro...
terça-feira
Teoria do Monstro Esparguete
Nos EUA existe uma grande celeuma relativamente ao ensino nas aulas de ciência da Concepção Inteligente a par da Teoria da Evolução Natural. [Definições em entrada deste blogue "Errata ao Público"]
Esta incursão da fé, no que deveria ser reino somente do racional, dá uma ideia da religiosidade nos EUA, na vertente "mais papista que o papa". A questão nem é que se queira ensinar a Concepção Inteligente na escola, mas que o queiram fazer nas aulas de ciência!
Este debate é ao nível do ensino secundário e não universitário. Pessoalmente penso que esta situação, para nós estranha, poderá ser vantajosa para a ciência americana (portanto mundial), ao alimentar os fundos para a investigação da Teoria da Evolução Natural. Assim, ter-se-ão mais meios para estudar o campo da biologia evolutiva, produzindo mais conhecimento, que irá apoiar ou desapoiar a teoria, produzindo explicações e questões. O normal na Ciência.
A desvantagem cai na ignorância de quem sai dos liceus e, em corolário, da população americana em geral. Tendo em atenção as últimas eleições penso que a UN deveria tomar uma resolução para o salvamento destas pessoas. Senão vai à força! A dificuldade será arranjar outro Bush...
Para ver uma espécie de reclamação humorosa ir a este sítio. O reclamante não só obteu resultados palpáveis, como agora transformou a sua Teoria do Monstro Esparguete num sucesso comercial. Querem comprar umas canecas ou umas camisolas?
Actualização: Esparguete no New York Times
Esta incursão da fé, no que deveria ser reino somente do racional, dá uma ideia da religiosidade nos EUA, na vertente "mais papista que o papa". A questão nem é que se queira ensinar a Concepção Inteligente na escola, mas que o queiram fazer nas aulas de ciência!
Este debate é ao nível do ensino secundário e não universitário. Pessoalmente penso que esta situação, para nós estranha, poderá ser vantajosa para a ciência americana (portanto mundial), ao alimentar os fundos para a investigação da Teoria da Evolução Natural. Assim, ter-se-ão mais meios para estudar o campo da biologia evolutiva, produzindo mais conhecimento, que irá apoiar ou desapoiar a teoria, produzindo explicações e questões. O normal na Ciência.
A desvantagem cai na ignorância de quem sai dos liceus e, em corolário, da população americana em geral. Tendo em atenção as últimas eleições penso que a UN deveria tomar uma resolução para o salvamento destas pessoas. Senão vai à força! A dificuldade será arranjar outro Bush...
Para ver uma espécie de reclamação humorosa ir a este sítio. O reclamante não só obteu resultados palpáveis, como agora transformou a sua Teoria do Monstro Esparguete num sucesso comercial. Querem comprar umas canecas ou umas camisolas?
Actualização: Esparguete no New York Times
segunda-feira
Comentário ao "O Islão É Integrável no Ocidente?"
Comento a última entrada do "A mão invísivel" sobre a questão: O Islão É Integrável no Ocidente?.
Se no geral eu ia acenando apoiante da sua percepção, em detalhes penso que mistura alhos com bogalhos. O islamismo é uma minoria que não tem comparação com as mulheres, os negros ou os homossexuais. A discussão relativamente a estes grupos é não o de lhes dar direitos maiores, mas os mesmos direitos.
Os homossexuais terem o direito de fazerem um casamento civil tal como os heterossexuais, situação que não restringe os direitos ou o bem estar dos outros. A adopção é um caso especial, pois interfere com a vida de outro ser humano. A discussão é acesa no que concerne o melhor interesse da criança. Ouvi a opinião de um par de técnicas envolvidas em processos de adopção que me explicaram que uma criança a ser adoptada tem geralmente uma bagagem de situações a resolver no seu intímo e não só. Receia-se que a adopção por homossexuais possa constituir um fardo a mais. O busílis não está só em se uma criança precisa da figura materna e paterna para um desenvolvimento equilibrado como pessoa, mas também o peso sobre essa família invulgar de uma sociedade extremamente preconceituosa.
As mulheres precisam de apoio para que possam conjugar o seu papel de mãe e de trabalhadoras competitivas. A pena de nada se fazer a este nível está à vista na baixa de natalidade. Também não concordo com quotas.
Quanto aos negros a situação refere-se a inverter situações de racismo e preconceito que não lhes permitiu/permite criar o seu espaço de sucesso na sociedade. A criação de quotas não será a resposta em Portugal, mas a situação em Portugal ou na Europa nunca foi comparável à dos EUA, onde a segregação racial antes dos anos 60 era gravíssima, mantendo na prática os negros sob escravidão nos estados sulistas e em bolsas de desprezo no Norte. Num cenário destes a utilização de métodos de beneficiação de uma raça que vem de tão baixo na escala social poderá ser a única forma mais rápida de instalar a justiça. Mesmo assim levou 40 anos.
As mulheres e os homossexuais têm como grupo a mesma cultura, o mesmo percurso, o mesmo zelo religioso da maioria que os oprime. Os negros também são na maioria como o resto da população, com a excepção da cor da pele e um percurso histórico diferente. Todos eles só não têm as mesmas oportunidades.
A questão do islamismo é outra. Têm uma cultura e religião diferentes e pedem um espaço muito próprio para praticarem um estilo de vida diferente. Mas em situações de moderação e respeito será o seu estilo de vida incapaz de conviver com o nosso estilo de vida? Não será injusto amassar toda a comunidade islâmica no pacote cinza do fundamentalismo?
Obviamente o Ocidente deverá traçar limites. Até a tolerância tem limites e parece-me que ainda existe um um discurso de tolerância levado a tal extremo que tolera o ignóbil. Acabar com o discurso de esquerda de aceitar tudo como cultura (cortar o clítoris a meninas não é cultura, ó idiotas intelectualóides! Eu não acredito na liberdade de discursar o ódio e incitar à violência e à morte).
Pergunta se o islamismo é integrável no Ocidente. O islamismo moderado é. Vivo em Hamburgo e vejo islâmicos todos os dias e não sinto qualquer tipo de ameaça. Quando vejo as mulheres de lenço não me incomodo, se bem que ainda me questiono quando vejo as crianças de lenço ou uma vez vi uma senhora de burqa e quase me espetei de bicicleta contra uma árvore. Contei este episódio a amigos e eles observaram-me de forma estranha. Dei-me conta que me achavam intolerante. Explicaram-me que usar burqas e lenços é a cultura deles. Eu retorqui que se as mulheres o fazem por querer, eu não tenho nada contra, mas esta certeza tem de ser assegurada. Eu quero que se uma delas não quiser usar lenço que tenha a liberdade para o fazer. Eu acredito que na generalidade assim seja. Eu vejo grupos de raparigas, umas com e outras sem lenço. Há uns dias vi uma mulher deslumbrante na rua. Usava lenço e um manto-vestido que esvoaçava à volta do corpo elegante. Os sapatos eram de salto alto e acentuavam o porte orgulhoso e seguro. A sua beleza natural parecia acentuada por toda uma aura de exotismo e afirmação silenciosa. Talvez eu me engane, mas no seu rasto não havia subjugação, mas somente uma escolha.
Hoje a grande questão do islamismo na Europa é a sua colagem a uma entidade transnacional de morte. Esta organização, como se concluiu nos últimos ataques a Londres, atrai com sucesso jovens de segunda geração, aparentemente bem integrados, bem educados e de classe média. Que laços de lealdade os levaram àquela acção? Eu não descarto problemas de desajustamento que jovens de outras origens étnicas resolvem geralmente em estróinices.
Concordo que o Ocidente deve EXIGIR a secularização do Islamismo no seu seio (fora também seria desejável, mas aí são outros quinhentos). Caso isto não se verifique então... Então também concordo que o futuro será um incógnita triste.
Se no geral eu ia acenando apoiante da sua percepção, em detalhes penso que mistura alhos com bogalhos. O islamismo é uma minoria que não tem comparação com as mulheres, os negros ou os homossexuais. A discussão relativamente a estes grupos é não o de lhes dar direitos maiores, mas os mesmos direitos.
Os homossexuais terem o direito de fazerem um casamento civil tal como os heterossexuais, situação que não restringe os direitos ou o bem estar dos outros. A adopção é um caso especial, pois interfere com a vida de outro ser humano. A discussão é acesa no que concerne o melhor interesse da criança. Ouvi a opinião de um par de técnicas envolvidas em processos de adopção que me explicaram que uma criança a ser adoptada tem geralmente uma bagagem de situações a resolver no seu intímo e não só. Receia-se que a adopção por homossexuais possa constituir um fardo a mais. O busílis não está só em se uma criança precisa da figura materna e paterna para um desenvolvimento equilibrado como pessoa, mas também o peso sobre essa família invulgar de uma sociedade extremamente preconceituosa.
As mulheres precisam de apoio para que possam conjugar o seu papel de mãe e de trabalhadoras competitivas. A pena de nada se fazer a este nível está à vista na baixa de natalidade. Também não concordo com quotas.
Quanto aos negros a situação refere-se a inverter situações de racismo e preconceito que não lhes permitiu/permite criar o seu espaço de sucesso na sociedade. A criação de quotas não será a resposta em Portugal, mas a situação em Portugal ou na Europa nunca foi comparável à dos EUA, onde a segregação racial antes dos anos 60 era gravíssima, mantendo na prática os negros sob escravidão nos estados sulistas e em bolsas de desprezo no Norte. Num cenário destes a utilização de métodos de beneficiação de uma raça que vem de tão baixo na escala social poderá ser a única forma mais rápida de instalar a justiça. Mesmo assim levou 40 anos.
As mulheres e os homossexuais têm como grupo a mesma cultura, o mesmo percurso, o mesmo zelo religioso da maioria que os oprime. Os negros também são na maioria como o resto da população, com a excepção da cor da pele e um percurso histórico diferente. Todos eles só não têm as mesmas oportunidades.
A questão do islamismo é outra. Têm uma cultura e religião diferentes e pedem um espaço muito próprio para praticarem um estilo de vida diferente. Mas em situações de moderação e respeito será o seu estilo de vida incapaz de conviver com o nosso estilo de vida? Não será injusto amassar toda a comunidade islâmica no pacote cinza do fundamentalismo?
Obviamente o Ocidente deverá traçar limites. Até a tolerância tem limites e parece-me que ainda existe um um discurso de tolerância levado a tal extremo que tolera o ignóbil. Acabar com o discurso de esquerda de aceitar tudo como cultura (cortar o clítoris a meninas não é cultura, ó idiotas intelectualóides! Eu não acredito na liberdade de discursar o ódio e incitar à violência e à morte).
Pergunta se o islamismo é integrável no Ocidente. O islamismo moderado é. Vivo em Hamburgo e vejo islâmicos todos os dias e não sinto qualquer tipo de ameaça. Quando vejo as mulheres de lenço não me incomodo, se bem que ainda me questiono quando vejo as crianças de lenço ou uma vez vi uma senhora de burqa e quase me espetei de bicicleta contra uma árvore. Contei este episódio a amigos e eles observaram-me de forma estranha. Dei-me conta que me achavam intolerante. Explicaram-me que usar burqas e lenços é a cultura deles. Eu retorqui que se as mulheres o fazem por querer, eu não tenho nada contra, mas esta certeza tem de ser assegurada. Eu quero que se uma delas não quiser usar lenço que tenha a liberdade para o fazer. Eu acredito que na generalidade assim seja. Eu vejo grupos de raparigas, umas com e outras sem lenço. Há uns dias vi uma mulher deslumbrante na rua. Usava lenço e um manto-vestido que esvoaçava à volta do corpo elegante. Os sapatos eram de salto alto e acentuavam o porte orgulhoso e seguro. A sua beleza natural parecia acentuada por toda uma aura de exotismo e afirmação silenciosa. Talvez eu me engane, mas no seu rasto não havia subjugação, mas somente uma escolha.
Hoje a grande questão do islamismo na Europa é a sua colagem a uma entidade transnacional de morte. Esta organização, como se concluiu nos últimos ataques a Londres, atrai com sucesso jovens de segunda geração, aparentemente bem integrados, bem educados e de classe média. Que laços de lealdade os levaram àquela acção? Eu não descarto problemas de desajustamento que jovens de outras origens étnicas resolvem geralmente em estróinices.
Concordo que o Ocidente deve EXIGIR a secularização do Islamismo no seu seio (fora também seria desejável, mas aí são outros quinhentos). Caso isto não se verifique então... Então também concordo que o futuro será um incógnita triste.
domingo
As árvores do meu pai são minhas também
No 100 nada li um texto belíssimo: "As árvores do meu pai". Como quando lemos reflectimo-nos a nós, pensei no meu pai e nas suas árvores. Contudo, o meu pai não é bem um cuidador de árvores, mas mais um cientista maluco. Ele planta e enxerta e decepa e experimenta, criando criaturas aladas despojadas do seu voo, retorcidas na forma de fumo, siameses estranhos. Mas não pensem mal do meu pai. Ele ama as suas árvores e não lhes quer mal. Eu espero que sejam felizes na sua mudeza de árvore e várias vezes observei-as e auscultei-as esperando ouvir-lhes a respiração primordial talvez diferente, talvez aflita.
As árvores do meu pai fazem parte integrante da minha memória antes da minha saída para o mundo. Partilhei muito com elas. Aquela pereira-anã muito retorcida e cheia de nós, a que eu colava gaze molhado a sonhar que era enfermeira. Ou a cerejeira que, num ano, criou durante duas semanas o assento perfeito num ramo alto em que eu me recostava de livro na mão e a comer as cerejas à distância do braço. A pereira luxuriante que continha em si três espécies diferentes, atirando em diferentes épocas, pêras diversas à minha boca de fome satisfeita. O diôspire com quem partilhei o meu pequeno-almoço de Outono tantas tantas vezes. As oliveiras a que eu me encostei em greve friorenta pelo direito alienável de uma adolescente de fazer nenhum (muito menos apanhar algumas míseras azeitonas no Inverno gelado!). Eu deitada debaixo da macieira a observar os raios de sol a dançarem à volta das folhas. A abeloeira que me dava visão para uma janela de ilusões.
Quando retorno ao meu reino imenso, que agora, ao meu olhar de adulta é um apertado jardim, caminho devagar a reencontrar todas as amigas. Cada uma delas cria em mim um estado de profundo contemplamento, em que sou levada na maré das memórias. Meço-lhes o crescimento, as rugas, a beleza, atrevo-me a tocá-las e é nesses momentos que eu melhor sinto a alegria despreocupada da minha infância e as perguntas amarguradas da minha adolescência. As árvores do meu pai são os diários do meu amanhecer.
O reverso da moeda: Hiroxima e a cultura da amnésia japonesa
Vítimas absolutas
Os vizinhos asiáticos não perdoam ao Japão a selvajaria da sua aventura imperial. Na China, ela é responsável pela morte de um milhão e meio de militares e de mais de dez milhões de civis. Os japoneses usaram armas biológicas contra a população. Três mil chineses foram sacrificados em experiência laboratoriais. A resistência japonesa à memória, que obriga o Governo a patéticos e quase anuais pedidos de desculpa, permite que as antigas vítimas façam permanente chantagem sobre Tóquio.
O problema é mais fundo, explica o holandês Karel Van Wolferen num dos mais penetrantes livros sobre o Japão (The Enigma of Japan Power, 1989). É que o Japão tem uma cultura de vitimização e até um termo para isso - higaisha ishiki (consciência de ser vítima). Na vida social e na história.
Os japoneses viveram a guerra, quer na conquista quer na derrota, como uma "catástrofe natural", de que ninguém é responsável. Escreveu um intelectual, citado por Van Wolferen, a propósito da invasão da China: "No exterior, um Japão animado por intenções imperialistas parecia invadir a China. No interior, a maioria dos dirigentes políticos tinha o sentimento de que o país era arrastado para o pântano da guerra por uma espécie de processo inevitável."
Mesmo sem ter em conta a propaganda revisionista, os filmes e romances apenas relatam o sofrimento dos japoneses. Estes ficam estupefactos quando lhes explicam o sofrimento causado aos outros.
Prossegue Van Wolferen: "Os bombardeamentos de Hiroxima e Nagasáqui simbolizam a forma última da "vitimização"." Os japoneses sofreram "de forma única e exemplar". "É hoje corrente no Japão considerar estes bombardeamentos como o acto mais abjecto de toda a guerra. Alguns vêem neles o crime do século".
A explicação da guerra, da responsabilidade do sistema imperial, do processo de capitulação deixam de interessar. "Hiroxima é um templo do martírio japonês. Eles consideram que o Japão sofreu em nome da Humanidade para que o mundo tomasse consciência da importância da paz." Tal como o santuário de Yasukuni, onde estão as almas dos militares mortos, inclusive os criminosos de guerra, que tantos sarilhos tem criado à diplomacia japonesa.
A Alemanha fez um trabalho de memória profundo, porque associou a sua tragédia à sua responsabilidade histórica. O Japão recusa essa associação, portanto não faz o trabalho de memória. Hiroxima tornou-se num presente envenenado, que consolida a cultura da amnésia.
No Público de hoje
Os vizinhos asiáticos não perdoam ao Japão a selvajaria da sua aventura imperial. Na China, ela é responsável pela morte de um milhão e meio de militares e de mais de dez milhões de civis. Os japoneses usaram armas biológicas contra a população. Três mil chineses foram sacrificados em experiência laboratoriais. A resistência japonesa à memória, que obriga o Governo a patéticos e quase anuais pedidos de desculpa, permite que as antigas vítimas façam permanente chantagem sobre Tóquio.
O problema é mais fundo, explica o holandês Karel Van Wolferen num dos mais penetrantes livros sobre o Japão (The Enigma of Japan Power, 1989). É que o Japão tem uma cultura de vitimização e até um termo para isso - higaisha ishiki (consciência de ser vítima). Na vida social e na história.
Os japoneses viveram a guerra, quer na conquista quer na derrota, como uma "catástrofe natural", de que ninguém é responsável. Escreveu um intelectual, citado por Van Wolferen, a propósito da invasão da China: "No exterior, um Japão animado por intenções imperialistas parecia invadir a China. No interior, a maioria dos dirigentes políticos tinha o sentimento de que o país era arrastado para o pântano da guerra por uma espécie de processo inevitável."
Mesmo sem ter em conta a propaganda revisionista, os filmes e romances apenas relatam o sofrimento dos japoneses. Estes ficam estupefactos quando lhes explicam o sofrimento causado aos outros.
Prossegue Van Wolferen: "Os bombardeamentos de Hiroxima e Nagasáqui simbolizam a forma última da "vitimização"." Os japoneses sofreram "de forma única e exemplar". "É hoje corrente no Japão considerar estes bombardeamentos como o acto mais abjecto de toda a guerra. Alguns vêem neles o crime do século".
A explicação da guerra, da responsabilidade do sistema imperial, do processo de capitulação deixam de interessar. "Hiroxima é um templo do martírio japonês. Eles consideram que o Japão sofreu em nome da Humanidade para que o mundo tomasse consciência da importância da paz." Tal como o santuário de Yasukuni, onde estão as almas dos militares mortos, inclusive os criminosos de guerra, que tantos sarilhos tem criado à diplomacia japonesa.
A Alemanha fez um trabalho de memória profundo, porque associou a sua tragédia à sua responsabilidade histórica. O Japão recusa essa associação, portanto não faz o trabalho de memória. Hiroxima tornou-se num presente envenenado, que consolida a cultura da amnésia.
No Público de hoje
sábado
Os fogos
Sou de uma pequena aldeia no sopé da Serra da Estrela. Os fogos florestais fazem parte das minhas memórias desde sempre. Lembro-me dos rebates de emergência do sino da igreja, bastante comum no Verão. A população saía em procissão (nomeadamente homens), de utensílios agrícolas às costas, para apagar o fogo. Eu e a minha mãe dormiamos na varanda, à cautela. De manhã ela saía de encontro ao meu pai desaparecido em combate, com comida e principalmente leite para lhe limpar a garganta do fumo. Todos os anos era assim, todos os anos o calor misturava-se com o fumo e as cinzas. Para mim Verão era fogo e vice-versa. Para mim o Verão trazia tardes a mirar o céu de rebolão negro e noites a mirar o clarão vermelho no horizonte. Com os anos os fogos diminuiram porque as florestas minguaram. As serranias já não tinham pinheiros, mas mato.
Há uns anos, quando estava de visita aos meus pais, o fogo apareceu. O som de rebate da minha infância e adolescência retornou. Contudo, a procissão de gente não ia para a batalha. Juntaram-se nos muros e comentaram. Telefonamos para os bombeiros e os olhos velhos do meu pai ficaram enovelados no fumo. O fogo ganhou.
Há uns anos, quando estava de visita aos meus pais, o fogo apareceu. O som de rebate da minha infância e adolescência retornou. Contudo, a procissão de gente não ia para a batalha. Juntaram-se nos muros e comentaram. Telefonamos para os bombeiros e os olhos velhos do meu pai ficaram enovelados no fumo. O fogo ganhou.
"Até ao Fim" e o Terrorismo
Encontrei no blogue da literatura um texto sobre um dos meus livros preferidos de sempre Até ao Fim do Vergílio Ferreira. Li-o ainda andava no liceu, num grande Verão, pois lembro-me ainda dos pensamentos de Cláudio (o narrador e personagem do livro) soprados pela brisa fresca dos fins de tarde em que a natureza acorda do estertor agonizante do calor. Foi um período de puro prazer contemplativo e o livro ficou-me afeiçoado na memória. Como sempre não a história, passo a passo, mas o que senti.
Quando vi então a entrada entitulada "Limites da Perfeição", de 20 de Julho, e me dei conta do assunto, parei como a receber notícias de um velho amigo. O livro é uma conversa de Cláudio com Cláudio, um traçar da sua vida até à vida do filho Miguel, que jaz morto ali perto. Não se diz como Miguel morreu, mas sabe-se que a sua morte não foi "natural". Miguel fez algo e morreu.
Pois o Sr. João Paulo Sousa, autor da entrada, concluiu que Miguel morreu após ter "atentado" um ataque terrorista. Eu, quando o li, pensei que o Miguel tinha morrido de toxicodependência. Haverá melhor maneira de saber que um novo tempo se desenhou após o 11 de Setembro?
Quando vi então a entrada entitulada "Limites da Perfeição", de 20 de Julho, e me dei conta do assunto, parei como a receber notícias de um velho amigo. O livro é uma conversa de Cláudio com Cláudio, um traçar da sua vida até à vida do filho Miguel, que jaz morto ali perto. Não se diz como Miguel morreu, mas sabe-se que a sua morte não foi "natural". Miguel fez algo e morreu.
Pois o Sr. João Paulo Sousa, autor da entrada, concluiu que Miguel morreu após ter "atentado" um ataque terrorista. Eu, quando o li, pensei que o Miguel tinha morrido de toxicodependência. Haverá melhor maneira de saber que um novo tempo se desenhou após o 11 de Setembro?
Trauma pós-guerra, presume-se
Há 60 anos, os EUA lançaram uma bomba atómica sobre Hiroxima.
Na altura o Le Monde escreve como cabeçalho: Uma revolução científica: Os americanos lançam a sua primeira bomba atómica sobre o Japão.
Na altura o Le Monde escreve como cabeçalho: Uma revolução científica: Os americanos lançam a sua primeira bomba atómica sobre o Japão.
sexta-feira
Causas
O Abrupto continua a liderar a campanha PODE O GOVERNO SFF COLOCAR EM LINHA OS ESTUDOS SOBRE O AEROPORTO DA OTA PARA QUE NA SOCIEDADE PORTUGUESA SE VALORIZE MAIS A “BUSCA DE SOLUÇÕES” EM DETRIMENTO DA “ESPECULAÇÃO”?
Outra causa: poderia o Público lançar uma versão em linha do "Inimigo Público"? Para os desterrados? SFF? :-)
Pedido, também ao Público: quando o Miguel Sousa Tavares não publica a sua crónica, podiam pôr uma nota a confirmar o seu bem-estar? Ele tem mostrado tal pessimismo que eu ando preocupada. Força MST! :-)
Outra causa: poderia o Público lançar uma versão em linha do "Inimigo Público"? Para os desterrados? SFF? :-)
Pedido, também ao Público: quando o Miguel Sousa Tavares não publica a sua crónica, podiam pôr uma nota a confirmar o seu bem-estar? Ele tem mostrado tal pessimismo que eu ando preocupada. Força MST! :-)
Errata ao Público
Ontem vinha um artigo no Público intitulado "Criacionismo deve ser ensinado a par da evolução nas escolas, diz George W. Bush". Igualavam o Criacionismo com a Concepção Inteligente, o que é errado. Têm em comum o serem ofensivas de base religiosa contra os fundamentos da ciência e concretamente contra a Teoria da Evolução por Selecção Natural, mas conceptualmente e com virulência diferentes.
A Teoria da Evolução por Selecção Natural expressa a descendência de todos os organismos a partir de um antepassado comum, que foram divergindo em novas espécies pela acumulação gradual de modificações genéticas, sem um fim definido. Cada uma das modificações terão sido vantajosas ou, pelo menos, não tornaram a sobrevivência dos organismos portadores impossível.
A Teoria da Evolução por Selecção Natural é um sistema explicativo, cuja actualidade e aceitação científica se deve à sua capacidade em explicar e prever diversos fenómenos observáveis, e nomeadamente o facto de ser possível testá-la empiricamente. Sobrevive no debate científico desde que Darwin primeiro a concebeu na primeira metade do séc.XIX. Evoluiu ela própria no tempo, à medida que novos conhecimentos surgiam, sendo apoiada e enriquecida por outras descobertas e teorias como a da hereditariedade. Os seus fundamentos são utilizados hoje não só no campo da Biologia, mas noutros campos do saber. Tudo isto mostra a sua força como modelo explicativo.
O Criacionismo explica o aparecimento da Natureza como está na Biblia. Deus veio, trabalhou seis dias, criou tudo e descansou no sétimo. Baseia-se em fé.
A Concepção Inteligente aceita que os organismos descendam de um antepassado comum, aceita até um pouco de evolução natural, mas postulam a existência de um desígnio divino, que propositadamente guiou a evolução num determinado sentido. Baseia-se no ataque à Teoria da Evolução por Selecção Natural.
Mais tarde poderei comentar um pouco mais esta luta entre a religião e a ciência, que é mais notória nos EUA.
A Teoria da Evolução por Selecção Natural expressa a descendência de todos os organismos a partir de um antepassado comum, que foram divergindo em novas espécies pela acumulação gradual de modificações genéticas, sem um fim definido. Cada uma das modificações terão sido vantajosas ou, pelo menos, não tornaram a sobrevivência dos organismos portadores impossível.
A Teoria da Evolução por Selecção Natural é um sistema explicativo, cuja actualidade e aceitação científica se deve à sua capacidade em explicar e prever diversos fenómenos observáveis, e nomeadamente o facto de ser possível testá-la empiricamente. Sobrevive no debate científico desde que Darwin primeiro a concebeu na primeira metade do séc.XIX. Evoluiu ela própria no tempo, à medida que novos conhecimentos surgiam, sendo apoiada e enriquecida por outras descobertas e teorias como a da hereditariedade. Os seus fundamentos são utilizados hoje não só no campo da Biologia, mas noutros campos do saber. Tudo isto mostra a sua força como modelo explicativo.
O Criacionismo explica o aparecimento da Natureza como está na Biblia. Deus veio, trabalhou seis dias, criou tudo e descansou no sétimo. Baseia-se em fé.
A Concepção Inteligente aceita que os organismos descendam de um antepassado comum, aceita até um pouco de evolução natural, mas postulam a existência de um desígnio divino, que propositadamente guiou a evolução num determinado sentido. Baseia-se no ataque à Teoria da Evolução por Selecção Natural.
Mais tarde poderei comentar um pouco mais esta luta entre a religião e a ciência, que é mais notória nos EUA.
quinta-feira
Confissão
Começo por dizer que este filme é simplesmente uma passerele para o Sr. Pitt e a Sra. Jolie mostrarem como são "COOOOOOLL".
O que acho piada é o facto de sempre que esbarro com este cartaz eu ficar embasbacada a olhar para a Angelina e não o Brad! :-)
Sou heterossexual, mas tenho maior prazer estético a olhar mulheres. Eu acho isto interessante.
LA Crash - Colisão
"Crash" é não só uma palavra com sentido, mas som. O som da colisão. Mesmo antes de ver o filme lembrei-me do "Crash" de 1996 do Cronenberg. Não me lembro se era passado em Los Angeles, nem mesmo da história. Lembro-me do que senti ao ver o filme: sufoco e surpresa. Fiquei com a ideia que o filme era sobre pessoas que de alguma forma perdidas (algo tendencioso?) num meio de automatização esterilizada, procuravam estímulos poderosos dentro do que lhes era oferecido. Escolheram as duas sensações mais fortes: excitação sexual e colisões de automóveis. Outra forma de intoxicação cerebral, pensei. Lembro-me também que o cinema estava apinhado no início da sessão e ao terminar estava a um terço. Lembro-me que no percurso para casa as minhas amigas criticavam duramente o filme, enquanto eu procurava sentidos. Quando "LA Crash" começou apreendi uma ligação entre os dois filmes, mas foi ténue. Neste a colisão automóvel é um aperitivo para a colisão racial. Se no início somos apontados também para uma sociedade sôfrega de contactos e que os procura de uma forma perversa, rapidamente nos lançam nos episódios de fricção do caldeirão étnico.
São retalhos de histórias. Tristezas, solidões, violências, abusos, incompreensões q.b., e por vezes com tão pouco de verosímil ou bastas vezes tão politicamente correcto e escorridinho, que se constitui também como um ataque ao espectador. Subtileza precisa-se! O director segue o modelo de interligar as diferentes histórias introduzindo as mesmas personagens em diferentes retalhos, que tornou-se agora a moda, mas neste caso com todo o sentido e mestria. Existe a figura de estilo cinematográfica do cortejo das personagens a deambular as suas misérias estilo "Magnólia", mas sem o poder de envolvência que foi criado neste filme entre as personagens e o espectador ou uma banda sonora como a de Aimee Mann. Para completar e prover o filme com todos os pequenos acessórios de um filme "a sério" e talvez para o director mostrar um certo virtuosismo, um competentérrimo flashback. Finalizando, há cenas per se bastante boas. Não é um filme genial, mas um filme americano competente sobre um tema difícil.
A mensagem é que somos todos boa gente, a viver vidas difíceis, ok com pré-conceitos, mas, principalmente, o racismo alimenta-se da acção da cidade opressora sobre as pessoas, pois cada um de nós mostrará o seu melhor nos momentos de crise. Ah, e a redenção existe às pazadas!
Eu sugiro ir ver o filme. Pessoalmente preferiria a tal subtileza, mas a versão choque de certeza agrada a muita gente e, talvez por isso, não se fica insensível à delicada tarefa de viverem diferentes culturas juntas. Lembrar à gente a tolerância.
Mário Soares é frito
Na blogolândia li que o Dr. Mário Soares (MS) sacaneou o Poeta Manuel Alegre (MA). Não tenho seguido este assunto nos jornais e a minha informação vem mesmo dos blogues. Também li um bloguista exclamar como pode o MS e apoiantes estarem à espera que as camadas jovens votem nele. Eu sou trintona (não sei bem se ainda sou jovem), mas sei que na minha juventude fresca o MS era cota, mas o cota de todos os jovens. Não é sem fundamento o "slogan" usado numa das suas campanhas de "Soares é fixe". Ele sabia bem que nós o apoiavamos. Agora estamos nos 30, não sei como vão os meus companheiros geracionais, mas a chama de apoio ainda cá está, se me desiludiu como Presidente, esqueci. Os tempos mudaram, os tempos passaram, mas se não o apoiar não será porque está velho. Pessoalmente eu vejo o lugar de Presidente da República não para os novos, mas para os velhos, como o eremita sábio da montanha. O MS não é sábio, o MA não é sábio, mas são o mais perto que encontro na política portuguesa. O meu sábio da montanha não sacaneia. Mantenho-me atenta e crítica.
quarta-feira
Mário Soares é fixe
Parece que, segundo a blogosfera, os dois problemas da candidatura do Dr. Mário Soares são:
1) a sua avançada idade;
2) não há renovação.
Nenhum destes me parece um problema. O primeiro deve ser porque eu sou de uma geração que não se irá reformar. Vai ser trabalhar (laborar) até cair para o lado, que a bancarrota dos sistemas de Segurança Social não perdoarão. Não há problema, quem quer ser parasita como as gerações que me antecedem? Autêntica geração-rasca!
O segundo... Renovação por renovação não vale a pena. Substituir mau (não estou a escrever que o Dr. Mário Soares foi mau, longe de mim) por péssimo não vale mesmo a pena. Eu pessoalmente não tenho pensamentos como "Cá está! Um político com amor ao serviço público, que defende as suas ideias, pudera, na casa dos 40 não podia ser de outra forma!" Pelo contrário. Eu até respeito mais os velhotes, que podem estar reumáticos, mas pelo menos têm ideais e ainda viveram em alturas em que se tinha que arriscar o pescoço por eles.
Não digo que vote "Soares é fixe". Na verdade se o Poeta Manuel Alegre concorrer terei que confessar que não resistirei a votar em alguém que faça discursos poéticos. Que fantásticas vão ser as mensagens de Natal e Ano Novo!
1) a sua avançada idade;
2) não há renovação.
Nenhum destes me parece um problema. O primeiro deve ser porque eu sou de uma geração que não se irá reformar. Vai ser trabalhar (laborar) até cair para o lado, que a bancarrota dos sistemas de Segurança Social não perdoarão. Não há problema, quem quer ser parasita como as gerações que me antecedem? Autêntica geração-rasca!
O segundo... Renovação por renovação não vale a pena. Substituir mau (não estou a escrever que o Dr. Mário Soares foi mau, longe de mim) por péssimo não vale mesmo a pena. Eu pessoalmente não tenho pensamentos como "Cá está! Um político com amor ao serviço público, que defende as suas ideias, pudera, na casa dos 40 não podia ser de outra forma!" Pelo contrário. Eu até respeito mais os velhotes, que podem estar reumáticos, mas pelo menos têm ideais e ainda viveram em alturas em que se tinha que arriscar o pescoço por eles.
Não digo que vote "Soares é fixe". Na verdade se o Poeta Manuel Alegre concorrer terei que confessar que não resistirei a votar em alguém que faça discursos poéticos. Que fantásticas vão ser as mensagens de Natal e Ano Novo!
A sociedade de consumo
A blasfémia é um blogue por onde tenho passado várias vezes por dia. Entre a orgia crítica, tão excessiva que cai no descrédito, existem uns textos a defender o modelo económico, cujas únicas leis seriam as do mercado. Não sei se é blasfémia, sei que esta visão me deprime. Deprime-me uma sociedade que seja governada por leis humanas cujo único objectivo é somente a acumulação de riqueza e mais riqueza. Vir-me-ão dizer que vários agentes a puxar para o seu lado, acabará por nos deixar, a meio caminho, na abundância... Que seja assim, pergunto ainda: "Abundância de quê?" Desculpem a minha dúvida, que me levou a acercar a prateleira, puxar um livro e ler:
A esperança que alentava Marx e os melhores movimentos trabalhistas - de que, algum dia, essas horas vagas emanciparão os homens da necessidade e tornarão produtivo o animal laborans - baseia-se na ilusão de uma filosofia mecanicista que supõe que a força de trabalho, como qualquer outra energia, nunca se perde, de modo que, se não for dissipada e exaurida nas pesadas tarefas da vida, nutrirá automaticamente outras actividades "superiores". O modelo que inspirava esta esperança de Marx era, sem dúvida, a Atenas de Péricles que no futuro, graças ao vasto aumento da produtividade do trabalho humano, prescindiria de escravos para se sustentar e se tornaria realidade para todos. Cem anos depois de Marx, sabemos quão falacioso é este raciocínio: as horas vagas do animal laborans nunca são gastas noutra coisa senão em consumir; e, quanto maior é o tempo de que ele dispõe, mais ávidos e insaciáveis são os seus apetites. O facto de estes apetites se tornarem mais refinados, de modo que o consumo já não se restringe às necessidades da vida mas, pelo contrário, visa principalmente as superfluidades da vida, não altera o carácter desta sociedade; implica o grave perigo de que chegará o momento em que nenhum objecto do mundo estará a salvo do consumo e da aniquilação através do consumo.
A condição humana de Hanna Arendt
Para Arendt, o animal laborans é o agente que labora, i.e., cuja actividade pretende sastifazer as necessidades imediatas. O trabalho é a actividade que produz objectos/serviços para lá das necessidades. Nos tempos antigos a maior parte das pessoas laboravam, mantendo alguns poucos, que trabalhavam. Daí a escravidão de muitos para conferir a liberdade a poucos. Segundo esta definição o agricultor labora, o artista trabalha; o comerciante labora, o político trabalha. :-)
A revolução industrial não libertou o homem do labor, mas imprisionou-o ainda mais. Antes o labor era uma actividade que seguia o ciclo da natureza, o resultado do labor ainda que efémero e cansativo, poderia conferir prazer (quantos poemas a cantar os camponeses e os pastores?). Com a introdução da montagem em série a repetição própria do labor torna-se independente de qualquer ciclo natural e o "laborador", a maior parte das vezes, nem consegue apreender o resultado final da peça que constrói. A automação também falhou em libertar o homem do labor, mas deu-lhe tempo livre. Assim, temos hoje mais "laboradores", mas com mais tempo para poderem também ser trabalhadores. Contudo, a liberdade do trabalho para todos, sonhada por tantos teóricos do séc. XIX e XX, não foi atingida. O homem com o tempo-livre e a liberdade de escolha escolheu consumir, em vez de criar.
Mas nem tudo está perdido: a gente quando bloga trabalha! Blasfémia?
A esperança que alentava Marx e os melhores movimentos trabalhistas - de que, algum dia, essas horas vagas emanciparão os homens da necessidade e tornarão produtivo o animal laborans - baseia-se na ilusão de uma filosofia mecanicista que supõe que a força de trabalho, como qualquer outra energia, nunca se perde, de modo que, se não for dissipada e exaurida nas pesadas tarefas da vida, nutrirá automaticamente outras actividades "superiores". O modelo que inspirava esta esperança de Marx era, sem dúvida, a Atenas de Péricles que no futuro, graças ao vasto aumento da produtividade do trabalho humano, prescindiria de escravos para se sustentar e se tornaria realidade para todos. Cem anos depois de Marx, sabemos quão falacioso é este raciocínio: as horas vagas do animal laborans nunca são gastas noutra coisa senão em consumir; e, quanto maior é o tempo de que ele dispõe, mais ávidos e insaciáveis são os seus apetites. O facto de estes apetites se tornarem mais refinados, de modo que o consumo já não se restringe às necessidades da vida mas, pelo contrário, visa principalmente as superfluidades da vida, não altera o carácter desta sociedade; implica o grave perigo de que chegará o momento em que nenhum objecto do mundo estará a salvo do consumo e da aniquilação através do consumo.
A condição humana de Hanna Arendt
Para Arendt, o animal laborans é o agente que labora, i.e., cuja actividade pretende sastifazer as necessidades imediatas. O trabalho é a actividade que produz objectos/serviços para lá das necessidades. Nos tempos antigos a maior parte das pessoas laboravam, mantendo alguns poucos, que trabalhavam. Daí a escravidão de muitos para conferir a liberdade a poucos. Segundo esta definição o agricultor labora, o artista trabalha; o comerciante labora, o político trabalha. :-)
A revolução industrial não libertou o homem do labor, mas imprisionou-o ainda mais. Antes o labor era uma actividade que seguia o ciclo da natureza, o resultado do labor ainda que efémero e cansativo, poderia conferir prazer (quantos poemas a cantar os camponeses e os pastores?). Com a introdução da montagem em série a repetição própria do labor torna-se independente de qualquer ciclo natural e o "laborador", a maior parte das vezes, nem consegue apreender o resultado final da peça que constrói. A automação também falhou em libertar o homem do labor, mas deu-lhe tempo livre. Assim, temos hoje mais "laboradores", mas com mais tempo para poderem também ser trabalhadores. Contudo, a liberdade do trabalho para todos, sonhada por tantos teóricos do séc. XIX e XX, não foi atingida. O homem com o tempo-livre e a liberdade de escolha escolheu consumir, em vez de criar.
Mas nem tudo está perdido: a gente quando bloga trabalha! Blasfémia?
terça-feira
Descobri uma micro-causa
PODE O GOVERNO SFF COLOCAR EM LINHA OS ESTUDOS SOBRE O AEROPORTO DA OTA PARA QUE NA SOCIEDADE PORTUGUESA SE VALORIZE MAIS A “BUSCA DE SOLUÇÕES” EM DETRIMENTO DA “ESPECULAÇÃO”?
Faço aqui a minha contribuição silenciosa para a criação de uma sociedade de livre informação e cidadãos esclarecidos...
Nota produtiva pra amanhã: ir à página do Ministério da Economia e fazer a reclamação.
Nota produtiva a longo prazo: fazer graffitis nas paredes do Ministério da Economia.
Faço aqui a minha contribuição silenciosa para a criação de uma sociedade de livre informação e cidadãos esclarecidos...
Nota produtiva pra amanhã: ir à página do Ministério da Economia e fazer a reclamação.
Nota produtiva a longo prazo: fazer graffitis nas paredes do Ministério da Economia.
Queen Mary 2 em Hamburgo
Ontem um amigo convidou-me a ir ao porto ver o "Queen Mary 2" e eu disse que "sim", como podia ter dito "não" ou "não me lixes" ou "estou-me nas tintas". No caminho perguntei-me como iria o nível de aborrecimento na minha vida.
Queen Mary 2
Quando chegamos verifiquei que o que para mim era um claro sinal da decadência da minha vida era para o resto da cidade um acontecimento. Havia pessoas por tudo o que era sítio com vista: relvados, praia, andaimes, escadas.
Ainda não tinha escrito, mas moro em Hamburgo. Cidade do norte da Alemanha, com a maior densidade de milionários, cosmopolita, jovem, bela, verde, com um tempo pavoroso. Se passarem perto entre Maio e Novembro é uma cidade que vale a pena visitar. Deixo uma ligação em que apresentam uma visualização de 180 graus da margem norte do Elbe (um dos rios de Hamburgo), onde ontem me juntei aos cidadãos germânicos para ver o tal navio-cruzeiro: aqui.
O pessoal por aqui aproveita todas as ocasiões de tempo seco para fazer churrascos e piqueniques e beber cervejas ao ar livre. Assim, não me admirei minimamente de ver grupos de pessoas espalhadas na conversa, com as cervejolas, gente mais reflectida com as mantinhas sobre a relva a comer do papel de alumínio comida-rápida turca. Ao longe um prédio movia-se muiiiiiiiiito lentamente. O Queen Mary 2 é o navio dos superlativos, a chamada cidade sobre a água. No porto de Hamburgo tens mesmo de ser superlativo para atrair atenção, pois todos os dias tens navios enormes a entrar rio acima até aqui. São navios-contentor, feios e com nomes femininos, a vir de locais longínquos como o Chile ou a China. A margem sul de Hamburgo é uma grande extensão de contentores e gruas e navios atracados. Ainda assim, a vista não é repulsiva, é uma beleza de máquina. De noite, com as luzes, é uma vista cativante.
Porto de Hamburgo
Estive uma hora à espera que a cidade flutuante fizesse talvez 1 quilómetro até nós, entre foguetório e os barcos (agora ridiculamente minúsculos na comparação) que abriam caminho. Mas foi agradável, já que a noite estava amena e havia uma atmosfera de festa. Como sinal dos tempos discutiamos a possibilidade do Queen Mary 2 ser atacado por terroristas. De vez em quando soava o apito do navio. Escrevo apito porque não encontro outra palavra, mas o som era cavernoso e poderoso. Era o som de chamamento dos extra-terrestres no filme mais recente do Spielberg "A guerra dos Mundos". Várias vezes me deixei absorver pela sensação de que a qualquer momento apareceria uma máquina gigantesca com tentáculos que iria fulminar-nos em pó branco.
A festa
Mas não aconteceu nada assim fantástico e perigoso. Num finalmente o navio passou-nos à frente, um arranha-céus imenso a movimentar-se muito perto, os da margem assobiaram e vaiaram, os do barco cumprimentaram-nos (a inveja é muito feia).
A noite terminou comigo num metro apinhado (extremamente raro) a observar as famílias que retornavam calmamente às suas casinhas agradáveis, junto aos canais e caminhos florestados dos subúrbios de Hamburgo. Vida boa.
Queen Mary 2
Quando chegamos verifiquei que o que para mim era um claro sinal da decadência da minha vida era para o resto da cidade um acontecimento. Havia pessoas por tudo o que era sítio com vista: relvados, praia, andaimes, escadas.
Ainda não tinha escrito, mas moro em Hamburgo. Cidade do norte da Alemanha, com a maior densidade de milionários, cosmopolita, jovem, bela, verde, com um tempo pavoroso. Se passarem perto entre Maio e Novembro é uma cidade que vale a pena visitar. Deixo uma ligação em que apresentam uma visualização de 180 graus da margem norte do Elbe (um dos rios de Hamburgo), onde ontem me juntei aos cidadãos germânicos para ver o tal navio-cruzeiro: aqui.
O pessoal por aqui aproveita todas as ocasiões de tempo seco para fazer churrascos e piqueniques e beber cervejas ao ar livre. Assim, não me admirei minimamente de ver grupos de pessoas espalhadas na conversa, com as cervejolas, gente mais reflectida com as mantinhas sobre a relva a comer do papel de alumínio comida-rápida turca. Ao longe um prédio movia-se muiiiiiiiiito lentamente. O Queen Mary 2 é o navio dos superlativos, a chamada cidade sobre a água. No porto de Hamburgo tens mesmo de ser superlativo para atrair atenção, pois todos os dias tens navios enormes a entrar rio acima até aqui. São navios-contentor, feios e com nomes femininos, a vir de locais longínquos como o Chile ou a China. A margem sul de Hamburgo é uma grande extensão de contentores e gruas e navios atracados. Ainda assim, a vista não é repulsiva, é uma beleza de máquina. De noite, com as luzes, é uma vista cativante.
Porto de Hamburgo
Estive uma hora à espera que a cidade flutuante fizesse talvez 1 quilómetro até nós, entre foguetório e os barcos (agora ridiculamente minúsculos na comparação) que abriam caminho. Mas foi agradável, já que a noite estava amena e havia uma atmosfera de festa. Como sinal dos tempos discutiamos a possibilidade do Queen Mary 2 ser atacado por terroristas. De vez em quando soava o apito do navio. Escrevo apito porque não encontro outra palavra, mas o som era cavernoso e poderoso. Era o som de chamamento dos extra-terrestres no filme mais recente do Spielberg "A guerra dos Mundos". Várias vezes me deixei absorver pela sensação de que a qualquer momento apareceria uma máquina gigantesca com tentáculos que iria fulminar-nos em pó branco.
A festa
Mas não aconteceu nada assim fantástico e perigoso. Num finalmente o navio passou-nos à frente, um arranha-céus imenso a movimentar-se muito perto, os da margem assobiaram e vaiaram, os do barco cumprimentaram-nos (a inveja é muito feia).
A noite terminou comigo num metro apinhado (extremamente raro) a observar as famílias que retornavam calmamente às suas casinhas agradáveis, junto aos canais e caminhos florestados dos subúrbios de Hamburgo. Vida boa.
segunda-feira
Desmancha-prazeres!
Pronto! Eu curiosíssima para ver o novo filme do Tim Burton com o homem mais sexy que alguma vez tive a sorte de ver e o "The Economist" tinha de fazer uma boa crítica ao filme! Mas porque é que estes tipos têm que meter o bedelho onde não são chamados? É que isto é como os teus pais serem fãs da mesma banda de rock que tu! Tira completamente a piada da coisa!
Eu adoro Huckabees
O detective mostra o mundo a um cliente problemático
Há umas semanas vi um filme chamado "I [desenho de um coração] Huckabees" (estilo I love New York, em que o love é expresso pelo desenho de um coração). O filme é um absurdo delicioso em que pessoas com questões existenciais procuram uns detectives para a resolução de problemas existenciais (um deles é protagonizado pelo Dustin Hoffman e outro pela Isabelle Hupert). O filme é um caos de situações, em que as personagens se entrelaçam e desenlaçam, ao belo estilo de que algo que tu faças por mais insignificante que seja terá efeitos nos outros, similar ao caso da borboleta no Brasil a provocar um ciclone no EUA, ou algo assim parecido. No fim (pessoal que quer ver o filme, desligue que eu vou desvendar a moral da história) ficamos a saber que o que os detectives pretendem é ensinar aos seus clientes que a vida é uma tragédia e sofrimento, mas que vale a pena. Lembrei-me do filme ao ler a Pública deste passado fim-de-semana. Está pejado de tragédias humanas. Algumas que arrepiam, outras que compreendemos trágicas para a pessoa, mas que levantam sorrisos de gozo a quem a tragédia não bateu à porta, outras absurdamente existenciais. É o sobrevivente desfigurado de Hiroshima, o Sr. Alves que tinha o sonho de um pénis maior e acabou com um pénis morto, Polanski e a perda em 1969 da sua mulher grávida assassinada por um grupo satânico, os hikikomori no Japão, pessoas que não conseguem sair dos seus quartos anos a fio, claúsura voluntária, eremitas sociofóbos. Sofrimentos e tragédias pessoais, que chegaram ao conhecimento público. Mas todos sofremos alguma dor interior. Muitas das vezes tão estupidamente não importante, que dói ainda mais. A existência é absurda, dói e vale a pena. Cheguei a esta moral... Parabéns pra mim :-|
Há umas semanas vi um filme chamado "I [desenho de um coração] Huckabees" (estilo I love New York, em que o love é expresso pelo desenho de um coração). O filme é um absurdo delicioso em que pessoas com questões existenciais procuram uns detectives para a resolução de problemas existenciais (um deles é protagonizado pelo Dustin Hoffman e outro pela Isabelle Hupert). O filme é um caos de situações, em que as personagens se entrelaçam e desenlaçam, ao belo estilo de que algo que tu faças por mais insignificante que seja terá efeitos nos outros, similar ao caso da borboleta no Brasil a provocar um ciclone no EUA, ou algo assim parecido. No fim (pessoal que quer ver o filme, desligue que eu vou desvendar a moral da história) ficamos a saber que o que os detectives pretendem é ensinar aos seus clientes que a vida é uma tragédia e sofrimento, mas que vale a pena. Lembrei-me do filme ao ler a Pública deste passado fim-de-semana. Está pejado de tragédias humanas. Algumas que arrepiam, outras que compreendemos trágicas para a pessoa, mas que levantam sorrisos de gozo a quem a tragédia não bateu à porta, outras absurdamente existenciais. É o sobrevivente desfigurado de Hiroshima, o Sr. Alves que tinha o sonho de um pénis maior e acabou com um pénis morto, Polanski e a perda em 1969 da sua mulher grávida assassinada por um grupo satânico, os hikikomori no Japão, pessoas que não conseguem sair dos seus quartos anos a fio, claúsura voluntária, eremitas sociofóbos. Sofrimentos e tragédias pessoais, que chegaram ao conhecimento público. Mas todos sofremos alguma dor interior. Muitas das vezes tão estupidamente não importante, que dói ainda mais. A existência é absurda, dói e vale a pena. Cheguei a esta moral... Parabéns pra mim :-|
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